quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Castigos

"Palavrão! Palavrão", gritava a criança feliz da vida, pois a mãe não conseguia proibi-la de pensar palavras horríveis. E a mãe, danada da vida, queria que 'palavrão' fosse um palavrão, para poder colocar a filha de castigo.

Foi aí que ela colocou a criança sentada de frente para a parede: era mãe e não precisava dar explicações a uma fedelha.

A fedelha, olhando para o branco da parede, só conseguia pensar, cada vez mais forte: "Palavrão! Palavrão! Palavrão beeeeem cabeludo!!!!"

E a mãe não entendia porque a filha sorria tanto, se estava de castigo.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

ado. a-ado. cada um no seu quadrado.

Ele chegou e a casa estava vazia. A mulher não estava nua, pronta para recebê-lo. A cama estava feita, sem nenhuma ruga na colcha: sinal de que não haviam respirado por ali esses três dias que esteve fora. Apoiou definitivamente a mala no chão e ainda pensou duas vezes se tiraria de dentro dela as roupas que iriam para a máquina de lavar ou se deixaria para depois, tomando logo o banho que o calor da cidade tornava urgente.

Com um pé arrastando o calcanhar do outro lado, tirou cada tênis e os dedos suados encolheram-se, experimentando a liberdade depois das 3 horas e meia de viagem. Estava tudo do jeito que deixara. Até o livro na diagonal, posição escolhida intencionalmente, para ter certeza, na chegada, se a casa tivera ou não recebido alguma visita.

Ela não foi; a recusa se fez concreta. A mulher disse não e agora ele estava sem abraço. Sabia que o desejo dela era o de ter ido junto, participado da viagem, mas isso ele não poderia oferecer: esse convívio não cabia no gostar que ele tinha reservado para ela. E cada um gostava sozinho, um do outro, ainda que ao mesmo tempo, juntos. Ele percebia o quanto aquela mulher olhava dentro de seus olhos e pedia com o corpo para que ele a amasse. Ele entendia, mas não podia. Se pudesse, não seria mais ele, pois já seria alguém que sentia amor por ela. E ela, por sua vez, deixaria de ser aquela que tinha, na ausência desse amor, o maior brilho de esperança no olhar. Eles precisavam continuar assim para manter a essência que fazia dessa história o que ela realmente era, com seus limites, auges, intervalos.

Ela precisava fugir de casa pois precisava de colo e temia não bastar o cheiro e as cores das paredes. Temia querer ficar e não sair, temia precisar de mais e sabia que essa necessidade não tardaria em aparecer. Suou as têmporas para negar a oferta e agradecer. Dormir no quarto vazio e ouvir os barulhos de fora sem que o ombro sardento a acolhesse parecia sem sentido e tentador.

Deitada na grama, com os olhos apontando para o céu, tentou contar nos dedos os momentos em que quisera dizer algo para alguém e optou por calar-se. Descobriu que eles somavam mais de vinte, seria mais conveniente contar nas gramas, que eram incontáveis. Suspirou alto. Voltou para casa pedalando sob o sol e encontrou o quarto vazio, também. Desejou que ele estivesse pensando nela e pensou mais forte ainda, como que empurrando os átomos do pensamento para o espaço em que ele estivesse ocupando naquele momento, materializando o sorriso que gostaria de, então, oferecê-lo.

Tomaram banho e dormiram ao mesmo tempo, sem um saber do outro. Estavam muito cansados.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Sabe quando você acorda com uma música na cabeça?

Pais E Filhos
Renato Russo
Composição: (letra: Renato Russo - Música: Dado Villa-lobos/renato Russo/marcelo Bonfá)

Estatuas e cofres. E paredes pintadas.
Ninguém sabe o que aconteceu.
Ela se jogou da janela do quinto andar.
Nada é fácil de entender.
Dorme agora.
É só o vento lá fora.
Quero colo. Vou fugir de casa.
Posso dormir aqui com vocês?
Estou com medo. Tive um pesadelo
Só vou voltar depois das três.
Meu filho vai ter nome de santo.
Quero o nome mais bonito.
É preciso amar as pessoas como se
Não houvesse amanhã.
Porque se você parar para pensar,
Na verdade não há.
Me diz porque que o céu é azul.
Explica a grande fúria do mundo.
São meus filhos que tomam conta de mim.
Eu moro com a minha mãe
Mas meu pai vem me visitar.
Eu moro na rua, não tenho ninguém
Eu moro em qualquer lugar.
Já morei em tanta casa que nem me lembro mais.
Eu moro com os meus pais.
É preciso amar as pessoas como se
Não houvesse amanhã.
Porque se você parar para pensar,
Na verdade não há.
Sou uma gota d'agua
Sou um grão de areia.
Você me diz que seus pais não lhe entendem.
Mas você não entende seus pais.
Você culpa seus pais por tudo.
E isso é absurdo.
São crianças como você
O que você vai ser, quando você crescer?

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Novo Mantra

Envelhecer
Arnaldo Antunes / Ortinho / Marcelo Jeneci

a coisa mais moderna que existe nessa vida é envelhecer
a barba vai descendo e os cabelos vão caindo pra cabeça aparecer
os filhos vão crescendo e o tempo vai dizendo que agora é pra valer
os outros vão morrendo e a gente aprendendo a esquecer

não quero morrer pois quero ver como será que deve ser envelhecer
eu quero é viver pra ver qual é e dizer venha pra o que vai acontecer

eu quero que o tapete voe
no meio da sala de estar
eu quero que a panela de pressão pressione
e que a pia comece a pingar

eu quero que a sirene soe
e me faça levantar do sofá
eu quero por Rita Pavone
no ringtone do meu celular

eu quero estar no meio do ciclone
pra poder aproveitar
e quando eu esquecer meu próprio nome
que me chamem de velho gagá

pois ser eternamente adolescente nada é mais demodé
com os ralos fios de cabelo sobre a testa que não pára de crescer
não sei porque essa gente vira a cara pro presente e esquece de aprender
que felizmente ou infelizmente sempre o tempo vai correr

não quero morrer pois quero ver como será que deve ser envelhecer
eu quero é viver pra ver qual é e dizer venha pra o que vai acontecer

eu quero que o tapete voe…


© Rosa Celeste Editora (Universal) / Setembro Ed. (DC.Consultoria)

BR-RC7-09-00007

Ficha Técnica da Faixa
Arnaldo Antunes: Voz
Edgard Scandurra: Guitarra, violão de 12 cordas e vocais
Betão Aguiar: Baixo
Chico Salém: Violão, guitarra e vocal
Marcelo Jeneci: Órgão, piano, bateria eletrônica, palmas e vocais
Curumin: Bateria, percussão e vocais


quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Homem nu

O homem nu não está pelado; o homem nu está inteiro.

Ele é de verdade, é rasgado, livre.
O homem nu é despido. De tudo.

O homem nu existe, dá, recebe. Oferece, bebe. O homem nu transcende, homem nu é deleite, é de quatro, é em pé, é sentado. Ele se mexe, sorri, ajeita os óculos. O homem nu tem medo, pede desculpas e sim, o homem nu fica pelado. Homem nu é macho, homem nu é leve; homem nu é bom. Demais.

Homem nu é homem de verdade, uma delícia de verdade de homem, uma verdade de homem delícia.

Homem nu é verbo. Homem nu delicía.

Homem nu é bom de falar. ho-mem-nu. Parece beijo com lambida. Homem nu merece beijo com lambida. Todos os beijos com lambida que uma mulher tenha para dar.

Homem nu pede, homem nu atende, o homem nu é corajoso, homem nu é fogo. Homem nu é lindo, homem nu me treme. Não se encosta no homem nu e ainda assim, se sente. Homem nu me molha, homem nu me olha, homem nu me come, homem nu me tem.

E eu não canso de falar homem nu.

O homem nu é foda.

Meuhomemnu.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Mais uma virginiana.

Ela me deu colo, me deu peito, cama, cafuné, amor. Ela me deu a vida, a luz. Esperou por mim e me embalou enquanto pôde. Curou meus machucados de infância, e, mesmo quando eles apareceram alguns anos depois, o carinho depositado à adulta não foi menor, mais seco ou menos voluntário.

Minha mãe, minha Rose, mãezinha, que hoje faz aniversário.


Parabéns que o dia é seu!

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Até quando esperar?

[Do feriado.]

Estava eu, há poucos minutos, num momento mulherzinha com uma grande amiga: bebendo vinho com um filme há horas no pause, como se fôssemos engatar algum momento, mas não. Queríamos rir, falar, nos lamentar, reclamar, pedir opiniões, desabafar, checar e-mail, distrair.

Mania de amiga.

Perguntávamos uma à outra e, no fundo, uma perguntava a si própria: por que desencontro? Já não chega, já não levamos tudo o que podíamos? Quando arriscar, quando não ir, quando parar, quando se cansar? Ela tentou me (se) tranquilizar e falou:

– ..., se bem que uma amiga me disse que existem várias mulheres dentro da gente e, a cada história, matamos uma delas. Sempre na próxima história a gente mata mais uma.

Eu, ainda decidindo se estava diante de uma boa notícia ou não, perguntei:

– Será?

Um pequeno silêncio se formou (quem me conhece sabe que só é possível, comigo por perto, um bem pequeno silêncio; essa coisa de nãofalar nunca esteve entre minhas maiores aptidões) antes que eu concluísse:

– Tá bem. Eu topo. Mas pergunta pra essa amiga aí quantas a gente precisa aniquilar. Eu tenho de saber se pra mim faltam 15, 35, 80 ou 417!

Depois de algumas gargalhadas, ainda meio inconformadas e com os dentes levemente arroxeados de vinho, começamos a calcular quanto tempo ainda precisaríamos, tendo em vista que cada mulher dessa carece de uns seis meses de história, no mínimo, antes do último suspiro.

Estava vendo a hora em que marcaríamos um carnaval na Bahia para agilizar o processo: tentar matar umas seis safadas em uma semana. Uma espécie de paredão interior, um corredor polonês sentimental. Foi um tal de fazer contas, estimativas, pensar em desenvolver planilhas, investigar cotas.

Chegamos a uma conclusão que poderia ser resumida da seguinte forma: “Amiga, tâmu matando mulher dos outros, não é possível! Tem gente que não matou essa mulherada toda ainda e tá aí tirando onda”. E desandamos a lembrar histórias alheias inexplicavelmente românticas.

Pensei na última palhaça morta. Tal pensamento acabou por me lembrar que a sirigaita interna anterior à última, a mulher da vez na fila da entrada do meu coraçãozinho, foi maldita. A danada galhofou a minha vida, me fez descer abaixo do nível do mar, dilacerou partes essenciais de autoestima, avacalhou todas as possíveis emoções do tempo que ela durou.

Não, amiguinha. Só nessa história aí morreu o equivalente a uma tribo indígena. Não era uma só mesmo. Matei umas dez mulheres da Deborah Secco, outras 17 da Britney, sem contar a bela contribuição que dei para quitar as fêmeas interiores de quatro ou cinco colegas do trabalho.

Eu e minha amiga, na verdade, não chegamos a uma conclusão. Ela ficou de perguntar para a dona da teoria se havia alguma informação na internet, alguma dica sobre o grupo seguidor da crença das muitas-mulheres-que-habitam-nosso-corpo-e-vão-morrendo-a-cada-história-nossa-de-vida.

O filme também não vimos. O vinho acabou, a fumaça saiu pela janela, continuamos sem resposta para nossas questões mais profundas. O combinado foi que eu voltaria com um texto, e ela, com a resposta do grande enigma.

Não sei se quero saber. Sério. Medo de descobrir que, depois de essa de agora morrer, ainda me restarão 55. Porque é a minha cara a ordem de grandeza ser daí para cima. Apenas mais cinco ou logo-a-próxima seria moleza demais. E nesse campo, pelo menos, minha vida nunca desfrutou de muita moleza.

Abraçamo-nos, ela voltou para casa, não sem antes deixarmos combinada a praia do dia seguinte: topei a ida ao Leblon, dentro do fusca, com um jornal e um livro, dar um mergulho ou não. Acreditávamos que ia fazer friozinho.

Em meia hora já estava cada uma em seu pequeno quadrado, com a cabeça martelando as mesmas dúvidas de antes. Um pouco mais felizes, por conta das horas anteriores – que, afinal de contas, foram ótimas!

[A trilha sonora do papo + o título do texto foram descobertos graças à amiga Lelê, que me hipnotiza, de tempos em tempos insere músicas em minha mente, de modo que não saiam tão cedo.]

[O arquivo veio do amigo fontecerta, que envia músicas boas e oportunas, sempre.]

[Revisão de texto: Luciano Rosa. Muitagradicida.]


Até quando esperar_Plebe Rude

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Está na hora de apagar a velinha...



Meu gigante tem olhos verdes e um cabelão, esvoaçante.

De sorrisão rasgado, roupas estampadas que, combinando com os cabelos, ventam na cadência dos passos largos proporcionados por pernas quase do meu tamanho (o ritmo de minhas pisadas triplicam quando passeamos juntas). Meu gigante taca na minha cabeça umas músicas com partes difíceis de esquecer. Daquelas que a gente fica cantando o mesmo verso por dias seguidos.

Meu gigante interior. Assim foi escalada Dusbalça, Dúsbal, Balceiro, ou apenas Lelê.

Lelê é linda e faz aniversário e eu adoro aniversários, gosto de ver as pessoas que eu amo ganhando presentes, abraços. Gosto de ver meus amigos sorrindo e amanhã é dia de Lelê e por isso pensei bastante num presente bom pras duas: bom de dar e de ganhar.


Não vejo a hora de abraçar essa moça que não presta (ela não é do bem, ok?), de brindar com choppinhos no Monteiro, no Antiga, com pastel, com cantoria. Com os amigos todos. Com amor de verdade saindo pelas orelhas, pelas mãos, pelas baforadas dos cigarros, pelas confissões de bêbado. Pelo prato do dia. Pela Lelê, meu gigantão interior, esvoaçante, linda, olhão verde e sorriso rasgado.

Parabéns, amigona! Loiviul total!!!

Livre-arbítrio hormonal.

Meus hormônios estão zonzos. A menstruação já tá aqui faz tempo e a rabugice persevera. A cólica está como se nada tivesse acontecido e os peitos... porra, eu posso jurar que meus peitos vão sair da blusa e invadir a cidade, atirando em todos os transeuntes. Tudo dói e é frágil.

Hormônios perdidos ao deus dará.

Se alguém encontrar, por favor, mande-os de volta para mim.

nem tão estranho assim.

Ninguém explicou como seria. Ninguém ao menos avisou que aconteceria. Eu, normalmente, duvidaria.

E sem explicação, sem avisos ou dúvidas, o mundo virou de lado. Virou, espelhou, deu cambalhota, mordeu a própria orelha. O mundo que era um agora é outro, mudou de cor, de fuso, de lógica. O toque se fez novo, o cheiro passou a ser hipótese, o calor agora era um só: o outro vinha de um jeito que não dá pra explicar, nem em blog. Os caminhos passaram a ser engraçados, as novidades não faziam tanto sentido e a língua que eu falava ficou estrangeira.

Era como chegar a algum lugar bem desconhecido e se sentir à vontade: não tinham vergonhas ou referências, eram apenas beijos, sonhos, delícias, sorvetes. Sabe aquela vontade de mudar para o Japão, quando tudo vira enfadonho? Então! Fiz a mudança pro Japão de mim, posso afirmar, agora. Mudei de planos, dei meia volta, refiz o retorno e passei pela mesma guarita.

Alguns encontros fazem pensar, outros machucam, outros nem chegam a acontecer e mudam nossas vidas. Foram algumas horas para entender, engolir, suportar.

Precisei de algum tempo - e quem não precisaria? - para absorver esse susto, essa ebulição, essa liberdade de solteira, de moça, de namorada, de amante, de vontade. De ser o que se bebe, o que se come, de ser uma flor, ou uma lajota (caso eu queira descansar meio marrom). Eu posso escolher algumas coisas para que as que não dependem de mim fiquem mais legais ou encaminhadas.

Ou que pelo menos sejam apenas as coisas que não dependem de mim.

Vontade de sair voando.
Impressão de que é possível.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

de 4 (atos).

Inexplicável.

Em palavras, gestos, sons, expressões, interpretações equivocadas, sonhos e suposições, construíra uma verdadeira história de amor em seus pensamentos. Uma história inventada, fantasiada, ilusória. E tão real que poderia descrever o gosto. O cheiro, o toque. Pensava se não estava maluca e, sim, tinha certeza de que estava. Nunca foi tão maluca e tão sensata, certa do que pensava e sentia. Tinha dúvidas e medos, queria previsões certeiras, planos escritos, resultados futuros. Era impossível, e tentava continuar pelo caminho que começara a ser traçado.

Sentia-o em cima, dentro, passando por ela. Sentia a língua babando seu corpo, suas mãos apertando, nariz respirando em suas coxas. Via fantasias realizadas, tudo era possível àquela impossibilidade, àquela distância, àquela quase mentira. A tão verdade que ali rondava, transitando por rodovias terrestres e aéreas, oscilava. Testava sua inteligência e autoconhecimento.

Incompreensível.

Penava. Precisava. Questão de salubridade. Agia como se não existissem limites, amarras, vidas reais. Dava seu jeito no ônibus, em casa, no trabalho, com os amigos. Olhava em volta e tinha o lado azul, quase seguro, das histórias de infância, da saudade que sentia, de sorrir para o olho fechando.

Ela era um sorriso, ele disse. Talvez por isso ela tenha chorado esse dia. De alegria, de saudade. Um choro pela crueldade que a situação vinha impondo, alimentando, evoluindo.

Necessário.

Não sabia mais fugir. Nem queria, e essa era a parte onde o querer estava à vontade: no persistir. Precisava continuar a tocar o corpo, ainda que por meio de uma louca exposição de desejos, de liberdades. Era uma história diferente, um apelo ao seu mais profundo compartimento. E ela vinha cedendo.

Hecatombe.

Ele tinha toda razão. Talvez essa fosse uma das poucas definições possíveis para ela, no momento.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Para onde?

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio – e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?

Carlos Drummond de Andrade recitando o poema

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

A vida é tão rara...

Eu ando meio cansada. Cheia de sono nas horas erradas, agitação descabida, humor oscilante, impaciente.

Pensativa, porém.

Pessoas em volta, antes conhecidas, são agora estranhas e, muitas vezes, enfadonhas. Faltam argumentos e vontade de criá-los para me relacionar com o mundo. Nada de dramas, sensações de fim, de dor. Não peço mais afago às derrotas. A seta aponta para cima, a espontaneidade tenta me guiar e - graças! - muitas vezes, consegue.

Os amores me escapam, o trabalho me entedia; dormir e acordar têm sido exercícios diários, muitas vezes transformados em tarefas árduas e sem data para acabar.

Aí vem uma calma, um vento baiano soprando aqui dentro, uma voz tranquila, dizendo que a hora passa, o dia cai, que tudo acaba. Eu respiro, ouço a noite, subo a ladeira entoando o mantra.

Troco o "tudo de novo amanhã" por "tudo novo amanhã", mesmo que não venha, regando os sentimentos novos, que são melhores que os antigos, ainda que esses últimos tenham servido para brotarem os que eu quero.

Tudo se interliga, uma coisa chama a outra.

Tudo, tudo, tudo vai dar pé.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Melhor que caminhar vazio

Caiu como uma luva esse conto. No dia que foi, na hora que foi, parecia estar esperando ser lido por mim. Gana de compartilhar com todos, da mesma forma que fizeram comigo, trazendo essa maravilha às minhas mãos.
Espero que gostem.

Dois ou três almoços, uns silêncios.
Fragmentos disso que chamamos de "minha vida".
_ Por Caio Fernando Abreu_

Há alguns dias, Deus — ou isso que chamamos assim, tão descuidadamente, de Deus —, enviou-me certo presente ambíguo: uma possibilidade de amor. Ou disso que chamamos, também com descuido e alguma pressa, de amor. E você sabe a que me refiro.

Antes que pudesse me assustar e, depois do susto, hesitar entre ir ou não ir, querer ou não querer — eu já estava lá dentro. E estar dentro daquilo era bom. Não me entenda mal — não aconteceu qualquer intimidade dessas que você certamente imagina. Na verdade, não aconteceu quase nada. Dois ou três almoços, uns silêncios. Fragmentos disso que chamamos, com aquele mesmo descuido, de "minha vida". Outros fragmentos, daquela "outra vida". De repente cruzadas ali, por puro mistério, sobre as toalhas brancas e os copos de vinho ou água, entre casquinhas de pão e cinzeiros cheios que os garçons rapidamente esvaziavam para que nos sentíssemos limpos. E nos sentíamos.

Por trás do que acontecia, eu redescobria magias sem susto algum. E de repente me sentia protegido, você sabe como: a vida toda, esses pedacinhos desconexos, se armavam de outro jeito, fazendo sentido. Nada de mal me aconteceria, tinha certeza, enquanto estivesse dentro do campo magnético daquela outra pessoa. Os olhos da outra pessoa me olhavam e me reconheciam como outra pessoa, e suavemente faziam perguntas, investigavam terrenos: ah você não come açúcar, ah você não bebe uísque, ah você é do signo de Libra. Traçando esboços, os dois. Tateando traços difusos, vagas promessas.

Nunca mais sair do centro daquele espaço para as duras ruas anônimas. Nunca mais sair daquele colo quente que é ter uma face para outra pessoa que também tem uma face para você, no meio da tralha desimportante e sem rosto de cada dia atravancando o coração. Mas no quarto, quinto dia, um trecho obsessivo do conto de Clarice Lispector "Tentação" na cabeça estonteada de encanto: "Mas ambos estavam comprometidos. Ele, com sua natureza aprisionada. Ela, com sua infância impossível". Cito de memória, não sei se correto. Fala no encontro de uma menina ruiva, sentada num degrau às três da tarde, com um cão basset também ruivo, que passa acorrentado. Ele pára. Os dois se olham. Cintilam, prometidos. A dona o puxa. Ele se vai. E nada acontece.

De mais a mais, eu não queria. Seria preciso forjar climas, insinuar convites, servir vinhos, acender velas, fazer caras. Para talvez ouvir não. A não ser que soprasse tanto vento que velejasse por si. Não velejou. Além disso, sem perceber, eu estava dentro da aprendizagem solitária do não-pedir. Só compreendi dias depois, quando um amigo me falou — descuidado, também — em pequenas epifanias. Miudinhas, quase pífias revelações de Deus feito jóias encravadas no dia-a-dia.

Era isso — aquela outra vida, inesperadamente misturada à minha, olhando a minha opaca vida com os mesmos olhos atentos com que eu a olhava: uma pequena epifania. Em seguida vieram o tempo, a distância, a poeira soprando. Mas eu trouxe de lá a memória de qualquer coisa macia que tem me alimentado nestes dias seguintes de ausência e fome. Sobretudo à noite, aos domingos. Recuperei um jeito de fumar olhando para trás das janelas, vendo o que ninguém veria.

Atrás das janelas, retomo esse momento de mel e sangue que Deus colocou tão rápido, e com tanta delicadeza, frente aos meus olhos há tanto tempo incapazes de ver: uma possibilidade de amor. Curvo a cabeça, agradecido. E se estendo a mão, no meio da poeira de dentro de mim, posso tocar também em outra coisa. Essa pequena epifania. Com corpo e face. Que reponho devagar, traço a traço, quando estou só e tenho medo. Sorrio, então. E quase paro de sentir fome.

(Publicado no jornal "O Estado de S. Paulo", 22/04/1986)




Sonhos, na voz do Moska

Realizando desejos

Estava sozinha, ainda que com uns 5 ou 6 amigos. Era show e ela dançava aleatória, sem se preocupar muito com o que tinha em volta. Deve ter ficado alguns minutos rodando em volta de um ponto qualquer, pois quando levantou a cabeça para prender os cabelos num rabo de cavalo, se deparou com um homem parado, em frente a ela, observando-a dançar.

- Não acredito...
- Nem eu. Cheguei no Rio hoje, meio de supetão. Não deu para avisar nada...
- Não sei o que dizer.
- Nem eu. Vamos dar um abraço, para começar?

Ela agora estava no meio de um descampado silencioso. Não havia mais nada nem ninguém, seus sentidos todos estavam focados naquele homem que era real a partir do all star, passando pelas calças jeans largas seguidas das blusas sobrepostas, chegando até o cavanhaque, que, na direção do seu olhar, iniciava o rosto que há anos gostaria de tocar.

Pensou em como esse encontro era, até então, improvável. O quanto o abraço que estava acontecendo a cada milésimo de segundo era digno de pedido de gênio da lâmpada. O quanto era muito mais fácil ela não estar ali, naquele lugar, naquele show. Não gostava da banda e cedeu apenas por querer muito sair para dançar naquela noite.

Tratava-se de um encontro inesperado, por qualquer ângulo que alguém poderia analisá-lo.
Abraçava-o sem ter coragem de largar por não fazer ideia do que deveria vir depois do abraço. Um beijo apaixonado? Uma gargalhada feliz, uma piada sobre o que aquilo ali significava? Sentia as costas, o peito, a barriga. Um restinho (ou um início?) de barba, encostando sua testa.
Desvencilharam os braços, mas os olhos, úmidos, admiravam-se.

- Como você veio parar aqui? Que bom isso, deve ser mentira...
- Eu vim porque cheguei e não te vi online. Chico e Carla vinham para cá e eu acabei topando. Parece mesmo mentira. Eu lembro de você ter falado que achava esses caras meio pela-sacos.
- Eu acho. Acabei vindo porque vários amigos ligaram chamando e eu achei que poderia ser uma boa opção para distrair.

Era nítido que eles não sabiam o que fazer e prolongaram o quanto podiam aquela série de motivos que os levaram a estar naquele show, naquele dia, na mesma fileira.

Até que não puderam mais e agora estavam ali, de carne, osso e nervosismo. E se olharam em silêncio.

domingo, 23 de agosto de 2009

sábado, 22 de agosto de 2009

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Os dois sentidos

Dessa vez, o tato passou longe. Apenas olhares separados por um cristal líquido, justamente o mesmo que propiciou o encontro.

Ouvidos e boca já haviam ligado os dois - sem sussurros, beijos ou lambidas - e um conhecia o êxtase do outro já há alguns anos, sem cheiro, sem mãos.

Um sentimento indefinível, perfeito pela distância, temperado pela impossibilidade da concretização do que deveria ser, do que queriam que fosse. Uma angústia de não saber do gosto, um prazer por gostar tanto daquele corpo que carregava um sorriso, um olhar, um tesão.

Sentimentos confusos, patéticos, até. Se lhe contassem essa história como experiência alheia, teria rido, sem dúvidas. Mas vivia emoções adolescentes, sofrimentos inexplicáveis, urgências apaixonadas. Precisavam ter-se, urgiam por um encontro. O corpo gritava, explodia, suava. Bastava que o milagre os pusesse lado a lado, pois o resto estava no ar, dentro de cada um.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Cariocas são bacanas...

Quinta-feira. Dezoito horas e dez minutos. Metrô da Cinelândia. Direção Zona Norte.

Primeiro trem: im-pos-sí-vel.

Segundo trem: há de ser esse. Não há tempo hábil para mais uma espera. O terapeuta me espera, na Tijuca, às dezenove.

Muita gente.

Estação Carioca, sensação de arrastão, de muvuca do foo fighters no Rock in Rio. Pessoas dominó, dois ou mais corpos ocupando o mesmo espaço - não existe lei da física no metrô a essa hora.

A voz eletrônica solicita, automática:
Prezado cliente. Ofereça ajuda aos idosos, gestantes e pessoas com necessidades especiais

A imprensada cliente aqui pensa que todos ali, sem exceção, naquele momento, possuem necessidades especiais – respirar é preciso e impraticável. Olho para baixo e não vejo pés, apenas um breu. Medo. Rezo um pai-nosso. Outro. Mais um. Mentalizo alívio.

Alívio, alívio, alívio, alívio. Alívio, alívio, alívio, A-lí-vi-o.

(essa sou eu, usando o mesmo método que tenho praticado para as fortes cólicas menstruais irem embora sem remédio.)

Silêncio espremido no carro do metrô.

Até que, como num quadrinho do Ziraldo daqueles de várias cabecinhas iguais e um balão que não se sabe de qual bolinha saiu, ouve-se uma voz:

- Aê, meu amigo, tu não lava o suvaco não? Sacanagem, bota um alho aí dentro dessa jaqueta que aqui tá foda, com esse braço levantado.

E todos riem, até quem não se conhece. Eu também. Um viva para a descontração carioca.

Estação Central. Respirar fica mais fácil.

Estação Estácio. Já posso me movimentar normalmente.

.Alívio.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Masturbação digital

Horas lendo posts passados do próprio blog.

Necessário, apenas.

De novo e mais uma vez.

Respirou alto em sinal de cansaço e olhou em volta com ar de poucos amigos. Já não queria mais ser tão simpática. Precisava sair dali e nada parecia colaborar com suas necessidades. Resolveu, pela décima quinta vez, naquela semana, que sua vida urgia por mudanças. Pegou sua mochila, se despediu de todos e saiu, deixando o computador ligado, as folhas espalhadas pela mesa, os colegas incrédulos e nitidamente constrangidos.

Não esperou a chefe ir atrás dela, não chamou por nenhuma amiga, não passou antes no banheiro. Chamou o elevador e como ele não chegou em dois segundos, desceu pelas escadas correndo, sentindo, apática, algumas lágrimas que desciam por seu rosto, gelando o caminho por onde passavam. Ao passar pelos seguranças e pela recepcionista que lhe deram, em vão, boa tarde, a moça chegou até a rua. Sentiu o sangue voltando a circular e a respiração funcionando novamente. Precisaria, agora, bancar seu dia de fúria.

Juntou as moedas espalhadas na bolsa e entrou no primeiro ônibus que a levaria para casa. Precisava fazer as malas, pois não era apenas um espaço que combatia com seus desejos.

O corpo ainda é pouco.

Acupuntura, psicanálise, macumba.
Simpatia, tarja preta, infusão, ayurvédica.
Cerveja, vinho, tchurus, cachaça.
Terapia corporal, da palavra, shiatsu, spa, meditação.
Workshop, batepapo, 102.

E o pulso, ainda pulsa.

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Can't

Não sei responder e-mail.

Faço em tópicos ou como uma carta?

Crio "ganchos" entre os assuntos para não ficar muita frase picada?
Já entro logo na resposta ou começo felicitando o destinatário?

Daí eu escrevo e acho que tem muita exclamação. Troco tudo por ponto final, o que deixa o e-mail frio demais. Sendo assim, acrescento alguns pontos e o texto passa a ter reticências: entro numa de que ficou cafona.

"Sofro" tanto que acabo escrevendo três míseras linhas.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Estando distraída.

Tavaqui pensando e resolvi escrever. Pensando em como eu tenho conseguido deixar a vida com ela própria.Na dúvida, escolher sempre ir. Não temer o risco, a frustração. Falo de coisas pequenas, decisões mais corriqueiras, não de grandes resoluções e aventuras. De escolher ir no apartamento da cunhada mesmo sem saber se ficaria agoniada de vontade de sair nos 5 primeiros minutos. De arrumar a mochila e ir pra Macaé de Cima, sem saber se entraria em pânico nas primeiras horas de viagem e sofreria por não ter como voltar. De esvaziar um quarto para me espalhar na casa do meu pai, sem saber se perceberia não ter sido a melhor opção ao esvaziar a primeira caixa.

Agora, na dúvida, eu tento. Distrair, divertir, estar com quem me importa. Gostar de estar junto. Tomar decisões, fazer a minha vida, me construir. Eu também sou as minhas opções, e eu acho que não sou o que andei fazendo em outros momentos.

Foi ótimo passar horas agradáveis na casa da cunhada com o meu irmão do lado, a viagem foi maravilhosa, esvaziei 3 caixas e tá tudo bem. Na dúvida, eu fui, eu vim e foi melhor do que ficar parada pensando no que tinha sido se tivesse me arriscado. Impressão de ter sido jogada no mundo semana passada. Abobalhada, por completo.

Moço, eu ando com vontade de sorrir.

terça-feira, 21 de julho de 2009

Às vezes, é difícil ser eu.

Achei que o 415 estava excêntrico demais, ao entrar na Pinheiro Machado. Quando eu olhei em volta, estava no Santa Bárbara.

- Moço, que caminho é esse?
- O caminho do ônibus.
- E que ônibus é esse?
- bóbóbó seis.
- Não é o 415???
- Não.
- E como eu achava que era o 415?
- Não sei, você tá indo pra onde?
- Pra Praça XV!!!!
- Ah, você desce ali e pega um pra Praça Xv.

Mas eu não tinha dinheiro: as moedas espalhadas na minha bolsa somavam apenas R$1,95. Nada a fazer. Respirei fundo, desci no Catumbi, fiz sinal pro 201, entrei, pedi ao motorista que me deixasse passar (era daqueles sem cobrador) e juntei todas as moedinhas que eu tinha (muitas!). "Paguei" a passagem e torci muito para que ele não conferisse nunca. A cada sinal fechado, eu reparava na movimentação dele e gelava, achando que ele estivesse contando moedas. Não estava. Pelo menos, não reclamou.

Cheguei no trabalho um pouco depois do que eu pretendia ter chegado. Sem café da manhã, chamei minha amiga para ir até a esquina comigo, comprar um iogurte.

- Vou sim, Carol. Espera só eu terminar aqui um troço?
- Claro.

E sentei.

- Pronto. Bora?
- Bora.

Aí eu abri a bolsa para pegar o cartão. O cartão sumiu.

Liga pro Manel Manel vê por favor se tem um cartão de banco no bolso da minha calça na cadeira do meu quarto? Carol, tem cartão nenhum aqui não... Liga pro Zona Sul Moço, por um acaso acharam um cartão aí ontem à noite? eu fiz uma compra e acho que deixei cair por aí. Não, não encontraram cartão nenhum. Esvazia a bolsa, abre tudo. Achei 40 centavos, eu tinha a passagem! Mas o cartão sumiu. Liga pra central cartões. Moço, fui furtada ontem só dei conta hoje, preciso cancelar o cartão. Ok, cartão cancelado, em sete dias úteis você estará recebendo um novo. Ok, obrigada.

Levanto e boto a mão no bolso para ir beber uma água.

No bolso.

O cartão.

Dentro do bolso, estava o cartão. Estava lá desde que eu levantei para o iogurte e sentei para esperar a amiga terminar o troço. Eu faço essas coisas automáticas e não registro tê-las feito.

- Oi, Michel. Acabei de cancelar meu cartão, pois achava que tinha sido furtada. Mas ele estava o tempo todo no meu bolso. Existe a possibilidade de cancelarmos o canelamento?
- Estarei verificando.
- Ok.
- Senhora Carolina, não dá. O chip já foi queimado. Agora a senhora precisará esperar o novo.
- Ok, Michel, muito obrigada.

E ainda nem chegou a hora do almoço...


Meu mundo é hoje _ Teresa Cristina cantando

domingo, 19 de julho de 2009

carência de glamour

Preciso colocar glamour na minha vida. Alguém me chama para beber em algum bar que venda aquele drink do copo raso com uma azeitona no fundo?

Pra beber de batom vermelho e comer a azeitona no palito, que nem musa de cinema.

To carente de glamour na minha vida. Cansei de chopp.

trintamenuzum

Ainda não voei de asadelta. Não li aquele livro, saí de casa, mas estou voltando, ainda que transitória. Percebi o amor feito a primeira cólica menstrual: sem referência no corpo, de sensaçao como esta. Não vi deus, senti raiva diária, entrei na acupuntura.

Não morri, nem fiz os cursos. Será que vai dar tempo? Os cabelos brancos dizem que não; a sombra da calma chegando diz que sim. Eu acredito, um pouco, em cada um. Por conta disso, fico sem saber qual deles seguir.

Saco cheio, irritadiça, tpm de um ano, um ano de domingo. Esperando uma segunda-feira da vida, com medo, com ansiedade, curiosa. Falando sozinha, temendo a loucura, corpo doendo, clamando por continuidade. Cabeça mudando, estranha.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Noêmia

A família a recebeu e ela pegou a família no colo. Alimentou os bebês, cuidou dos velhinhos, cozinhou para os adultos. Pegou no colo, lavou louça, trocou fralda, deu amor, levou foto na carteira. Noêmia entrou pra família pela minha bisavó, que eu nem cheguei a conhecer. Trazida de Paraty, não leu uma letra, não deitou com um amor, enquanto arrumava a cama dos casais e cuidava para que as crianças fizessem o dever de casa.

E gostava muito de cada um e dos cuidados que se dispôs a oferecer, enquanto chamava suas netas adquiridas de lindinhas, princesas. Fingia que reclamava quando eu deitava no seu colo para uma delícia de cafuné, mas sentia falta quando eu ficava muito fora de casa e falava: você não vai passar mais a noite aqui pra eu coçar a sua cabeça não?.

Até que um dia, ela precisou trocar de lugar e ser cuidada. E foi, diga-se de passagem, muito bem cuidada. Minha mãe Rose vem cuidando de Noêmia, alimentando, arrumando, dando remédio, aliviando dores. Abriu a porta da casa e deu um quarto; deu continuidade ao amor que a "véinha" recebia da tia Graciete e à retribuição de todo o carinho oferecido à nossa família.

Agora, a Noêmia está fraquinha, talvez indo embora, talvez lutando para ficar. Isso, só a vida sabe. E a gente vai sofrendo, vai entendendo, lembrando, agradecendo por ter podido conviver e receber tanto amor e tanta dedicação.

Obrigada mãe, obrigada, Noêmia. Por nós estarmos aqui, cuidados.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Malas.

Julho tem sido o mês das malas.

Não das sem alça, ruins de aturar (não que elas não tenham aparecido por aí...), mas das malas com roupas dobradas, de frio, biquini, edredon, meias, calcinhas e sutiãs. Malas com escovas de dente, desodorante, shampoo e condicionador. Sem sabonete, porque eu sempre esqueço o sabonete e acabo comprando no caminho.

Paraty com mala de rodinha, modesta, poucas roupas, animação meia-bomba. Macaé de Cima, mochilão grande, pra caber o edredon, panos, mantas, golas rolê, bombinha de asma, estoque de sorine.

A mala do próximo fim de semana será de livros. Porque estou me mudando. Ainda não para o meu cantinho, do jeito que eu planejei. Farei um pouso temporário para que a busca seja mais calma, para que não haja erro na escolha da sala que será minha, do quarto que terá as minhas roupas, meu sono e meus amores. Começo a me mudar aos poucos, com a preguiça de caixotes, vontade de Humaitá, de janela com vista, de viver mais junto do meu pai.

A Lagoa ali pertinho, voltar a correr em volta, almoçar com a mais nova aposentada do pedaço, me recuperar do calote, ficar perto dos amigos, dos cinemas, da Cobal.

Agosto eu fico véia, mas de vida nova.

Sobre o que temos falado.

O que é a vida do homem?
Algo que não é orientado para o bem ou para o mal, nem moldado para louvar ou censurar. A oportunidade leva o homem às alturas, a oportunidade o arremessa para baixo e ninguém pode prever o que será a partir daquilo que é.

Antígona _ Sófocles.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

"Se tudo pode acontecer..."

Pode acontecer de você estar andando no Centro da cidade e de repente fazer um silêncio, mesmo sendo meio-dia e meia.

É que tem dia que as coisas simplesmente acontecem e a gente fica com cara de quem não tá entendendo nada, porque são poucas as vezes que conseguimos entender realmente alguma coisa.

terça-feira, 30 de junho de 2009

Twitter

www.malvados.com.br

Entrei numa. Acharia mais legal, se não tivessem pessoas aleatórias me seguindo.

Engraçado, como uma palavra tem seu motivo modificado pela modernidade. Quando que a gente pensou que seguir e ser seguido poderia ser uma espécie de status...?

Sabedoria cartoonica


Boa viagem

Para mim, para ti.

E para quem mais quiser.

Porque viajar é bom demais.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

...



Extraída de www.malvados.com.br

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Quando o amor morreu

A imagem era borrada como muitas vezes a imagem de sonhos aparecem para quem está dormindo.

Uma fila de mulheres de preto entrava na capela e abraçava a mãe do defunto, que não parava de chorar. Os filhos choravam compulsivamente, enquanto levavam copos d'água para a mãe. Chegou a vez de Carmem entrar para cumprir com a obrigação de cumprimentar a família.

Ainda não sabia de quem se despediria, até se deparar com seu amor, envolvido por flores e com duas bolotas de algodão enfiadas no nariz. Começou, então, a acariciar o rosto do morto e gritar por seu nome.

Queria que fechassem logo o caixão para que a história encerrasse de vez, junto com o pensamento de que isso não poderia estar acontecendo. Chorava por alguém que não estava mais ali, enquanto que as lágrimas caíam sobre o rosto gelado de quem não estava mais ali.

Até que os funcionários do cemitério avisaram que o caixão seria fechado. Um lado de Carmem pensava que agora aquela história seria concluída e que, quando chegasse em casa, não teria mais o que esperar dele. O outro lado, o que estava mandando nela ali, naquele agora, entrou em desespero, como se o fato de o homem que amava ser enterrado mudaria a realidade que estava vivendo.

Ele já tinha morrido e a única coisa a ser feita era mandar aquele corpo oco de gente para onde vão os corpos nessa situação.

A morte já tinha chegado ali, e com ela, o luto, a saudade, o amanhã vazio que por sua vez, precedia um depoisdeamanhã um pouco menos pior.

Carmem acordou assustada, suada, triste. Merda foi a primeira palavra que pensou e o rosto que apareceu em sua cabeça, antes mesmo de abrir os olhos, foi o do falecido amor.

Tentou apagar aquela imagem, repetindo para si própria que merecia viver, com o famoso "apesar de". Ele não voltaria, estava morto. Essa história não merecia reticências, mas um ponto final.

Respirou fundo, comeu o seu mamão e foi a caminho do dia.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Migalha

Dos seus olhos eu tirei a dor e tirei a cura. O preto dos olhos e o branco da unha é o que lembro que me faz lembrar de que perdi você nem sei como nem sei onde nem sei se perdi. As palavras que voam e se perdem o cd que vira papel e a caneta que vira pincel. O boneco feio virou bonito e ninguém viu. Quem percebe que o dia caiu? O que não acaba nem começa e o que significa essa confusão de espaços que não sei mais qual é a ponta do início e qual é a ponta do fim? Qual, entre todas as coisas, começa lá no pé? Eu começo no pé ou na cabeça? Quantas dúvidas consigo colocar numa só pergunta? E o que podemos fazer quando o balão explode e os tripulantes todos caem pedindo socorro e ninguém voa para poder ajudar?

Quando o telefone toca imagino que é salvação, mas é engano.

Enganamos o mundo com nossos sorrisos e abafamos os gritos com nossos travesseiros. O sangue jorra, mas ninguém vê e isso transforma em não existente o fato que é de conhecimento de todos. O que me faz existir além da pontada no peito e da inflamação no tendão? A mentira que empurra tudo para frente me joga para trás como que numa onda de um mar revolto. Deixa para outro dia, será que você consegue abrir esse pacote? Quando eu abro tudo voa pelos ares. Cai migalha no chão e chama barata. (as baratas gostam de migalhas. A formiga chama migalha de banquete.) A migalha atrai a barata na hora. Também não é assim, demora até a barata chegar. Demora nada. Eu que demoro a ver as baratas. E quando vejo são centenas delas, em cima das migalhas. É muita migalha pra pouca barata e barata demais para uma migalha só.

Migalha.

Migalhamigalhamigalhamigalha

Amiga lha

A migá-lha

À míngua

E no fim, tudo acaba em palavras.

(Texto de março de 2003)

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Autajuda

Eu não gosto de literaturas de autajuda. Um amigo meu me carregou para uma palestra dessas uma vez. Fiquei curiosa a respeito do que alguém poderia falar sobre a vida, que justificasse um ingresso não muito barato. As cadeiras estavam todas ocupadas: todos ávidos por respostas, instruções, enquanto o palestrante dizia que não havia receita de bolo para a felicidade, mas que nada era impossível depois que a pessoa identifica o seu foco na vida.

Aí ele contou que maravilha de vida ele conseguiu, enumerou cada tragédia que conseguiu superar, emocionou-se ao lembrar do primeiro momento em que ele conseguiu ajudar a mãe. Enquanto isso, rolavam projeções de um PowerPoint na parede: imagens coloridas, esquemas, frases fortes, com verbos no imperativo, trechos de fala de Gandhi, Charles Chaplin, Veríssimo. E a plateia anotava tudo (???) freneticamente.

Saí de lá um tanto quanto irritada com a pirotecnia pseudoútil do coroa bem apessoado. Orabolas, 70 reais para ouvir que com um foco, tudo é possível? E o meu amigo, embevecido, falando que realmente, que justamente foi o foco que faltou naquele momento em que ele decidiu abrir o próprio negócio, quando fez nãoseioque, quando isso, quando aquilo. Eu queria sacudí-lo pelo pescoço, gritar peloamordedeusjuraquevocêouviuaquilotudoelevouasério?, mas preferi observar - como acontece na maioria das vezes - e pensar.

Ontem eu ganhei um livro de autoajuda. Ao questionar a razão do presente, o presenteador começou a defesa dizendo que, em primeiro lugar, ele não considerava aquele um livro de autoajuda. Fico aqui, com meus botões, a pensar: seria essa uma questão subjetiva, em se tratando de um livro cuja capa é a representada abaixo?


Chegando em casa, contei a história aos meus roomates e todos concordamos com o fato de que não. Não é subjetivo. Livros com lista de benefícios na contracapa e verbo imperativo no título, do mesmo autor de Como fazer amigos e influenciar pessoas não dá para não ser considerado autajuda.

Acho que existem algumas autajudas disfarçadas - Marcelo, ainda estou pensando se o Amor Líquido é autajuda ou não... ainda não estou certa, mas acho que ele é somente uma leitura bacana, mas que não oferece soluções para problemas ou promete melhorar nada na vida do leitor... mas vamos ver; voltarei a isso em algum momento -, mas o livrinho do Dale Carnegie, antes mesmo de abrí-lo - ele continua lacrado, enquanto eu penso se sucumbo à curiosidade ou decido o que fazer com a obra -, ele já mostra a que veio.

E teje dito.

=]


(Sim, eu agradeci o presente e entendi as boas intenções do presenteador. Não sou má nem malagradicida.)

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Matinais

Abriu os olhos e ele ainda dormia. Pensou no quanto queria estar ali dentro, dos olhos que ainda estavam fechados. Pensou no quanto o amava, tentando lembrar quando percebeu isso. Enquanto a língua passava pelos dentes que já não estavam mais separados, lembrou. Lembrou do dia em que pensou 'eu amo você', quase se rendendo ao impulso de deixar que isso virasse uma frase falada. (Tinha pensado de novo na noite passada, enquanto estavam os dois nus, se beijando e se apertando com força.) Pensou no quanto estava feliz ali, naquele agora que estava com os minutos contados. Levantou-se e foi para o banho, participar um pouco mais da casa do homem que amava. Ladrilhos, portas, janelas e todas as possíveis perspectivas do seu amor. Desejava pisar em cada pedaço, reparar cada manchinha da parede. Ali, ele vivia e ali ela estava, convidada pelo dono da casa, do abraço completo, o dono de tudo que ela poderia vir a dar para alguém. Era assim que se sentia: doável. Pensou se alguém recusaria um presente assim.

Desligou o chuveiro, se arrumou e voltou para o lado do amor, de onde nunca gostaria de ter saído.


[O que é o amor _ Maria Rita]

terça-feira, 16 de junho de 2009

Pequena Carol

Pequena Carol, aos 4 anos, para sua mãe:

Não vou casar nunca, mãe.

A mãe já olha para cima pensando que 'lá vem...'

Por que, minha filha?

Pequena Carol tava doida pra explicar:

Ah, é porque quando chega o aniversário do filho, a mãe trabalha o dia todo, desde cedo, arruma a mesa, a casa, faz comida e o pai tá lá. Descansando, não tá nem aí. Aí, quando chega a hora da festa, a mãe tá cansada de tanto trabalhar e o pai chega de banho tomado, cheirosinho, rindo pra todo mundo.

Pobre mãe.

Peneira zen

Ontem levei as primeiras agulhadas da minha vida: no cangote, na testa e na barriga.

O oriental disse que eu preciso ficar quieta, nem que seja uma hora antes de dormir. Desligar, ele disse. Falou das minhas disfunções energéticas: É, teremos bastante coisa pra trabalhar aqui...

Levei uns apertões também, umas estaladas, umas coçadas na cabeça.

A-d-o-r-o.

Virarei uma peneirinha zen.

Amém!

segunda-feira, 15 de junho de 2009

...por metro quadrado

A cada portaria eu penso se aquele rosto será minha rotina daqui a um ou dois meses.

Esperar, nesse caso, é bom, até.
Já vou sacando quem poderão ser meus próximos vizinhos e torço o nariz ao ver que saiu uma senhora com um cachorro, de dentro do elevador.

Olho em volta no elevador, lendo os avisos com atenção. Serão esses meus próximos avisos? Porta pantográfica, quem diria. Morro de medo de portas pantográficas!

A porta do apartamento não tem nada de familiar: o espaço, lá dentro, está vazio, oco, com cara de ninguém, com marca nenhuma, mas eu já me vejo. Às vezes, eu não consigo ver nada meu lá dentro: aí eu já sei que não estarei por ali daqui a um mês ou dois.

Minha cama, minha poltroninha, meu sofá. Geladeira, fogão, eu toda lá dentro, dormindo, vendo tv, deixando o telefone tocar sem atender, pois estou na onda de ficar comigo mesmo, fazendo um sanduiche... vivendo ali.

Ali, seja qual for o lugar, será que eu já vi, ainda está por vir o anúncio que chamará para o meu cantinho?

Ao mesmo tempo, o meu espaço está no mesmo lugar, num certo clima de despedida e incertezas que, como sempre, estão mais juntas de mim do que as pintas do meu rosto. Mas sem elas, o que seria do friozinho na barriga...?

Que venha o que está por vir, já que eu bem sei que meu cantinho tá bem guardado, em algum cantinho dessa cidade!

segunda-feira, 8 de junho de 2009

The Secret.

Um dia de lua, uma noite quente. Um sorriso, brinde de chopp, churrasco no terraço, abraço nas amigas. Um amor mão-dupla, uma casinha de vila, aluguel no bolso, duas horas de almoço. Viver com pouco, o tal do pouco suficiente, amar sempre, ser feliz amando. Como é bom. Ouvir a música, dançar por ela, dançar sozinha, dançar na sala, juntar bochecha. Tomar café da manhã, cozinhar a janta. Café da manhã na janela. Vê-lo dormindo. Como é bom. Cantarolar baixinho enquanto lava a louça. Andar na praia cedinho, de casaco. Acender uma vela, lavar a rúcula. Sexo na rede, na cama, no chão, no chuveiro. Sexo oral, dormir junto, acordar amassada. Sueca, truco, buraco de duplas. Gamão. Chopp com colarinho, cerveja original gelada. Pastel de costela, caldinho de feijão. Verde, Azul, Vermelho, Laranja. Uva. Meia calça, vento na janela do ônibus. Abraços, cafunés, chamegos. Nhém nhém nhéns.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Chove, chuva...

Depois de perder a hora e precisar me arrumar no [The Flash - mode on], não acho o guarda-chuva e saio sem ele.
Compro um quando descer do ônibus, pois sempre tem um ambulante oferecendo.

Do meio para o fim da Nossa Senhora, o céu caiu com força. Ufa, vai dar tempo da chuva estiar até chegar no Centro.

Mas foi tipo eu&chuvajuntinhasassim, indo em direção à 1o. de março. Desci eu e mais quatrocentos e cinquenta e oito gotas pesadas de chuva e não tinha nenhum ambulante me esperando.

Segurei a onda debaixo de um toldo para ver quem chegava primeiro - se o ambulante ou a redução da queda d'água.
Nem um, nem outro.

Tô uma eca.


Daí eu vi como estou bem. Em alguns momentos achava engraçada a minha situação e ria. Meu humor não se abalou. Foi bom ter dormido bem durante o fim de semana.

Tecla SAP

Quando a moça diz...
Kisses all over you.


...é pro moço ler...
Kisses, I love you.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Pra mim, foi inédito.

E não é que o motorista do 125 parou fora do ponto para um velhinho que fez sinal e só andou com o ônibus depois que ele e o outro velhinho - que aproveitou o ensejo e deu uma corridinha para alcançar - passaram da roleta.

Não, o sinal não estava fechado; a luz só ficou vermelha, inclusive, depois que eles subiram.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

no caminho

Pisava nas pastilhas do chão do Centro sem percebê-las. Por quanta coisa, aliás, uma pessoa é capaz de passar, em cima de quantas pastilhas se pisa ao longo de um ou dois dias?

Lembro que um dia decidi não deixar mais de perceber o que me rodeava: sorriria para cada um, cheiraria cada flor. Pularia cada linha do chão e não me esqueceria de olhar o céu.

Até que ainda esqueço, mas hoje eu lembrei. Olhei a rua, querendo levar um pedaço de alguns dias comigo.

Sinto algo que está prestes a transbordar. Seguro a boca para que, involuntariamente, não saia um nome, uma declaração, uma palavra, um grito.

Olho o braço, procurando um rastro, uma pista, alguma impressão digital, um pelo solto, um beijo esquecido, atrasado.

Sei que estou feliz até a saudade bater - que por sua vez só doerá até venha outro dia desses - e me pergunto se vale a pena viver assim.

Ainda não assimilei a resposta final porque é um sentimento grande como nunca, forte como nunca, bonito como nunca, gostoso como nunca e foi bom, como sempre.

Por enquanto, deixa só eu sentir assim e pensar no problema quando (e se) ele bater à minha porta.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Saldo insuficiente

Sabe aquele dia que você sai ás 19:30 da terapia na Tijuca e o riocard não tem saldo suficiente para o metrô? Aí você olha na bolsa e só tem 2,30 que não paga a passagem do metrô?

Anda até o ponto de ônibus e o Zé Ruela diz que ali não tem ônibus nenhum para Ipanema.

Aí você sobe num 410 ou 409 com o riocard insuficiente, passa na roleta e senta a janela. Passa por ruas que trazem lembranças boas e ruins, saudosas e angustiantes, engraçadas e estranhas.

Fica hipnotizada com a floricultura colada na casa do biscoito, quase chegando no Estácio - uma mistureba de cores, de elementos que transbordam da loja até a calçada. Quer tirar uma foto, mas a câmera do celular não alcançaria a distância, além de não ter flash.

Passa pela Lapa e vê a quantidade de gente animada que tem nesse mundo. É terça-feira e a fila da "Gafieira" está dobrando a rua. Carlinhos de Jesus está lá dentro, com um semblante nervosíssimo. Pensa que poderia tomar uma cerveja sozinha num boteco qualquer, mas sabe que não vai descer do ônibus.

Faz baldeação na Riachuelo e segue para a General Osório.

É, você merece um picolé da Garoto.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

[ anônimo ]

Quem é o (a) anônimo (a) que está fazendo aula de moto?

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Tudo ao mesmo tempo agora. Uma coisa de cada vez.

Quando o troço tá brabo, a gente sai da terapia e vai direto pro Centro espírita.

Porque energia boa é sempre bem vinda.

Sudoeste - Adriana Calcanhoto

...tenho por princípios
Nunca fechar portas
Mas como mantê-las abertas
O tempo todo
Se em certos dias o vento
Quer derrubar tudo?...

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Queridamiga

Rio, 4 de maio de 2009

(...)

Não sei se estou propriamente virando o jogo, não sei se seria justo com a expressão virar o jogo eu usá-la assim, nesse meu momento em que eu estou apenas tentando não deixar tudo desabar, porque tem horas que dá vontade. De desabar tudo. Aí eu fico procurando a tal da calma que me é tão necessária, mas que não lembro de tê-la encontrado alguma vez e absorvido da melhor maneira. Eu tô procurando, e é uma busca que me tira a paciência, sabia (rs)?

Aí eu olho para as outras pessoas, como disse no primeiro e-mail, e acabo vendo que elas são calmas, elas conseguem e quando não conseguem, nem sempre é tão ruim.

Aí eu penso que eu posso, e penso que você pode também.

(...)

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Eu sou... DEMAIS!



E teje dito!

terça-feira, 28 de abril de 2009

Hospital São Lucas: diversão garantida! ou O mundo é um circo!

Em decorrência da última de uma série de zicas que vêm me perseguindo desde o início deste ano, acabei posando no Hospital São Lucas, com muita dor abdominal, febre e moleza.

É impressionante como a estrutura de saúde com a qual a gente "conta" deixa a desejar. Mas o circo estava armado, independente disso.

Uma mulher loira, lá pelos seus sessenta anos, com uma roupa rosa bebê e um laço de veludo nos cabelos um tanto desgrenhados andava de um lado para o outro até sentar ao meu lado bradava: que frio faz aqui, não é? Detesto isso: com qual objetivo uma pessoa olha para o alto, fala como se estivesse apenas pensando alto e pede uma confirmação final, praticamente forçando o outro - que nunca o viu na vida - a participar de uma conversa que muito possivelmente não lhe é convidativa. Fingi que não ouvi, mas a senhora não parecia ligar para isso e continou dizendo que tinha uma doença não sei das quantas e que agora eles iam ver o motivo, já que se tratava de um mal de fumantes e ela tinha horror a cigarro. Levantei-me da cadeirinha e fui para outra fileira, de frente para a TV.

Ora bolas!

Alguns longos minutos depois, minha senha foi chamada. Na verdade, ela já havia sido chamada antes, mas a indicação do guichê 1 no painel eletrônico me fez pensar que o número chamado era o 1078 e não que o 078 poderia se dirigir ao guichê 1. Expliquei ao moço a confusão e lá fui eu.

Logo na entrada do consultório, a médica começou o freak show - que mal sabia eu, estava apenas começando: Que esmalte lindo, que cor é essa hein? Vou anotar. Desculpa, eu sei que você está doente, mas eu sou viciada em esmalte. Pegou o receituário e anotou: vitral risqué. Depois de dissertar sobre esmaltes, iniciou a consulta e me encaminhou ao laboratório, para receber a medicação e coletar sangue e urina para os exames.

- Pode sentar ali, Carolina.

E não é que o "ali" era ao lado da senhora de rosa-bebê antitabagista com doença de fumante? Bicho, a mulher gritava e chorava quando tiravam o sangue dela, e batia o pé no chão, e gritava meu deus o que é isso! e eu imagino ter caprichado no meu semblante de pavor quando perguntei à médica se eu realmente tinha de sentar ali, pois ela respondeu na hora que sim, eu podia ir para o outro lado.

Daí começou a luta das mocinhas para encontrarem a minha veia para tirar o sangue e deixar o remédio caindo, que acaba me deixando com marcas roxinhas pelo braço, mas com a qual que, de certa forma, já me acostumei. Até que o moço me chamou para fazermos o raio-x e, no que eu levantei, ele abriu a cadeira de rodas para mim. Eu realmente preciso usar essa cadeira de rodas? Ué, você não quer ir de cadeira de rodas? Você pode ir de cadeira de rodas para o raio x. Não, moço, peloamordedeus, prefiro ir andando.

O moço do raio-x pediu que eu tirasse o sutiã para o exame e eu fui para o banheirinho. Tirei o sutiã e deixei dobradinho em cima da caixa do vaso e fui rumo às chapas hightechs que me viraram de um lado para o outro por alguns minutos. Enquanto isso, entraram algumas pessoas do hospital, foram ao banheiro e saíram rapidamente. Numa dessas, um moço embrulhou meu sutiã e ia levando embora, achando que fosse da amiga que tinha acabado de trocar de roupa, mas perguntou se eu tinha deixado alguma coisa no banheiro, quando viu meu olho rabudo para o embrulho branco. Resgatei meu sutiã embrulhado em papel de enxugar mão e voltei para o andar de baixo.

Sentadinha esperando chegar alguém que acertasse a minha veia, vi a mulher-loira-rosabebê-quenãofumamastemdoençadefumante-quegritanoexamedesangue deixando louca a mediquinha viciada em esmalte:

- Dona Fulana, o seu caso não é para internação. A senhora pode tratar isso em casa.

- Até parece que eu vou conseguir me tratar em casa! E eu lá consigo ficar quieta em casa?

- Então a senhora não vai melhorar nunca.

- Essa doença pode matar?

- Olha. Todas as doenças podem matar. Hipertensão também mata. O que não significa que todos os hipertensos morrerão disso.

- Ai meu deus, pode matar? (chorando) Eu sou hipertensa, inclusive, minha pressão deve estar altíssima, você pode ver se está muito alta?

- Gabriel! Por favor, você tira pressão dessa senhora? Pode sentar ali que ele já vai ver para a senhora.

Aimeudeus. O "ali" de novo. O "ali" paralelo a um dedo apontando para a mesma direção de onde estavam as cadeiras do meu ladinho. Lá veio ela.

- Até parece... ficar em casa... poissim. Não vou fazer nada disso. Sabe quando eu vou me tratar? NUNCA! Pelo menos... quem manda lá sou eu. Acho que vou ter que chamar a minha mãe... esse idiota não vem... é, vou ter que chamar a minha mãe.

Eu neeeeeeem olhava a mulher. Queria só prestar atenção em cada palavra para poder escrever sobre isso depois sem ter trabalho de inventar. Até que chegou um mocinho inexpressivo, meio cabelo chitão e xorô, bermudinha, tênis e sentou ao lado dela que continuava dizendo que ia chamar a mãe. Até que ele entrou na onda, iniciando o que seria o auge do freak show que me pegou assim, de surpresa.

- A sua mãe está ali fora? Quer que eu chame?

- A minha mãe? Que nada! Tá bem longe ela, até parece que ela viria aqui comigo, minha mãe é uma peste!

- Você não se dá bem com a sua mãe? Eu também não me dou com a minha... ela não gosta de mim e agora eu ainda estou morando com ela.

- Eu não moro mais com a minha. Ela até paga meu plano de saúde, mas é uma peste. A sua mãe não gosta de você?

- Ela não gosta dos filhos, gosta de todo mundo de fora, menos dos filhos. Só teve filho pra infernizar a vida deles, sabe? Me deixou até com insônia,imagina!

- Ai, igual à minha... mas a minha só não gosta de mim.

(sim, eu estava rindo por dentro, me segurando para não pegar o celular e apertar o rec)

Nisso, a enfermeira chegou e falou com o mocinho:

- Senhor fulano, eu vou aplicar esses dois remédios, mas preste atenção: assim que eu aplicar, o senhor deve sair correndo para a casa, pois são remédios fortes. Corre o risco de o senhor cair aqui dormindo.

- Ai, doutora, não tem problema! Se a senhora conseguir me fazer dormir, já tenho motivos para agradecer a vida toda.

A enfermeira saiu sem responder e a loucaderosabebê-doentedefumantesemserfumante-quechoranoexame-querserinternada-eamãenãogostadela recomeçou, perguntando:

- Por que você não toma lexotan?

- Não me dou bem com lexotan...

- Eu tomo um dienpax de 10 e passo a noite em claro! Você quer que eu te leve em casa de carro?

- Não, muito obrigado, mas eu moro aqui em frente. Mas não me dou bem com esses remédios... nem rivotril.

- Rivotril tira o sono! (aqui entra aquele smile de olhos arregalados e boca reta, para representar a minha reação)

Senhor fulano foi tomar o remédio, senhora fulana não estava com a pressão alta. Os dois foram embora, finalizando o festival de aberrações da noite.

Ah sim. Fui medicada, os exames estavam todos normais, o médico disse que, provavelmente, foi algo que eu comi.

*Eu até sou uma pessoa criativa, mas não precisei inventar N-A-D-A para esse post. Ok, Luciano?

segunda-feira, 27 de abril de 2009

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Tudo tem seu preço

Tô vendendo a mandíbula.
Quem comprar, leva um par de pé.

A mandíbula tá quase zerada, canal tratado e as próximas intervenções já esão pagas.

O pé tá ardido na sola, dolorido e dormente no dedão, mas tá com um esmalte violeta lin-do.

Ári bába

Os indianos antenadíssimos de Glória Perez não me cheiram bem.

Super conectados, vivem batendo papo pela internet, atualizam blogue, conversam por webcam, adotam o e-commerce na empresa, viajam para o Brasil duas vezes por semana e se chocam ao ver uma mulher de biquini ou ao receber videozinhos do desfile da Daspu.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Tem dias que a gente se sente...

Ânimo desaparecido, ligue para o Disque Denúncia caso tenham alguma pista. 

Sabe quando a preguiça bate até na hora de beber água, mas aí é bom porque já minimiza a necessidade de se fazer xixi? 

Bicho, parece que tem uma bigorna de 2 toneladas no meu cóccix que não me deixa levantar para nada. Nada. Nada. Nada... 

Aí o blogue bomba, porque dá a sensação de estar fazendo alguma coisa, batendo papo, coisa de maluca mesmo, uma maneira legitimada de se falar sozinho ao mesmo tempo que conta para os outros. 


terça-feira, 21 de abril de 2009

Follow me

Fiz um negócio desses, do Twitter. Vai entender o motivo pelo qual alguém se cadastra num troço para seguir pessoas e ser seguida. Carência pura. Aí você vai lá e escreve coisas aleatórias para ser lido por seus seguidores e lê as coisas aleatórias dos seus seguidos. Genial, não? Eu não sabia o que era Twitter e hoje descobri, abri, cadastrei, "loguei", postei a primeira frase, mudei layout, aquela pataquada toda.

Luiza me deu a dica do Twitter dos Malvados, do Andre Dahmer, e tem realmente boas frases, tipo "São Paulo é para casar, o Rio é para foder" ou "eu só quero um cu para mijar dentro", ou "Tudo é passageiro, menos as concessões de transporte público. Nos resta ir à merda a pé".

Fiz um Twitter pra seguir os Malvados.

Enquanto isso, vou indo à merda a pé, com o cu todo mijado, para quem sabe, chegar em São Paulo.

Para o caso de te alguém twittermente mais atrasado que eu: http://twitter.com

"Porque eu já tô de saco cheio!"

Eu sei que pode parecer heresia. Mas tô com raiva do Chico. É, do Buarque e se ele aparecesse aqui agora na minha frente, eu lhe diria umas poucas e boas. Tudo pela letra da música que acabou me batizando.

Se eu tiver filhos, só vou me inspirar com axé music e frevo.

Vontade de falar palavrão

putaquiupariumerdacaralhobucetapirocamerdadenovo cucuenormecufedorentocaralhabuçanhafodaseputaquiupariudenovo manucuvaitomarnoolhodoseucu
vaitomarnomeiodoolhodoseucuenormefedorento.

merda.

música

One Love



One Love!
One Heart!
Let's get together and feel all right.
Hear the children cryin'
(One Love!);
Hear the children cryin'
(One Heart!),
Sayin': give thanks and praise
to the Lord and I will feel all right;
Sayin': let's get together
and feel all right.
Wo wo-wo wo-wo!

Let them all pass all their dirty
remarks (One Love!);
There is one question
I'd really love to ask (One Heart!):
Is there a place for the hopeless sinner,
Who has hurt all mankind just
to save his own beliefs?

One Love! What about the one heart?
One Heart!
What about?
Let's get together and feel all right
As it was in the beginning
(One Love!);
So shall it be in the end
(One Heart!),
All right!
Give thanks and praise to the Lord
and I will feel all right;
Let's get together
and feel all right.
One more thing!

Let's get together to fight
this Holy Armagiddyon (One Love!),
So when the Man comes there will be no,
no doom (One Song!).
Have pity on those whose
chances grows t'inner;
There ain't no hiding place
from the Father of Creation.

Sayin': One Love!
What about the One Heart?
(One Heart!)
What about the?
Let's get together and feel all right.
I'm pleadin' to mankind!
(One Love!);
Oh, Lord!
(One Heart)
Wo-ooh!

Give thanks and praise to the Lord
and I will feel all right;
Let's get together and feel all right.
Give thanks and praise to the Lord
and I will feel all right;
Let's get together and feel all right.

(http://www.playingforchange.com)

Playing for a change

Stand by me



When the night has come
And the land is dark
And the moon is the only light we'll see
No I won't be afraid, no I won't be afraid
Just as long as you stand, stand by me

And darling, darling stand by me, oh now now
Stand by me
Stand by me, stand by me

If the sky that we look upon
Should tumble and fall
And the mountains should crumble to the sea
I won't cry, I won't cry, no I won't shed a tear
Just as long as you stand, stand by me

And darlin', darlin', stand by me, oh stand by me
Stand by me, stand by me, stand by me-e, yeah

Whenever you're in trouble won't you stand by me,
Oh now now stand by me
Oh stand by me, stand by me, stand by me

Darlin', darlin', stand by me-e, stand by me
Oh stand by me, stand by me, stand by me.

(http://www.playingforchange.com)

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Cada qual no seu mundinho

Não daria para entender e ele sabia disso. Ela também e talvez por isso, eles não parassem de se olhar, como se pudessem ler os pensamentos um do outro. E que bom que não podiam, pois sabiam que nada seria entendido - o que já não era.

Ela tentava, inutil e incessantemente, mudar o que sentia e que acabava levando-a a agir de um jeito incompreensível. Mas toda quinta-feira era igual quando pegava o celular e enviava uma mensagem de texto para ele, que respondia prontamente aceitando o convite para jantar ou ir ao cinema ou qualquer outra desculpa para que acabassem entrelaçados em algum motel da cidade. Gostava daquele cheiro sem perfume que ele tinha, gostava de sentir as pernas dele pesando nas delas, empurrando as cochas e o abdomen para frente e para trás, outras vezes para cima e para baixo. Sabia que gostava disso e de quando isso se repetia. Sonhava com isso e chorava de saudade, quando faltava. E faltava sempre, entre um encontro e outro - semanas viravam séculos e um mês parecia eternidade de conto de fadas, sem a parte do viveram felizes para sempre.

Ele curtia, apenas, aquilo tudo, aquela pessoa ligando, conversando, abraçando. Gostava das piadas, dos tropeços da moça, das músicas que ela costumava compor e mostrar para ele, antes mesmo de passar pelo crivo da banda. Muitas vezes, os encontros doíam no bolso, pois ele preferia manter a tradição de se responsabilizar pelas contas de bares, cinemas, jantares e, claro, a do motel. Mas acabava valendo a pena, pois ele gostava das esporádicas companhias e noites que ela lhe proporcionava. Sempre ficava surpreso quando seu telefone apitava com os sms's convidando-o para alguma programação na sexta-feira. Gostava assim, sem compromisso, sem muita pergunta, era boa aquela dinâmica que o deixava livre entre uma diversão e outra com uma mulher bonita, inteligente e boa de cama como ela. Desde seu último relacionamento, a idéia de ter alguém com quem dividir a vida não lhe parecia muito tentadora. E sabia que essa tranquilidade poderia trazer problemas em algum momento - via como ela o olhava e de alguma forma, sabia que ela queria mais.

E assim eles seguiam, cada um com seu mundinho, se esbarrando aqui e ali, numa espécie de fingimento inocente, de que estavam levando com muita tranquilidade o que tinham, o funcionamento despojado dos encontros. Como se cada um estivesse ciente da responsabilidade que tinham sobre si, em relação ao mundinho que acordava alguns sábados ao seu lado.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Pra não saber.

Ele nunca soube o que a Carmem sentiu quando descobriu que, no fundo da sacola, além do que havia sido combinado de entregar, tinham outras coisas que ela preferia não ter recebido de volta.

Ela também preferiu não contar que, quando começou a seguir o seu caminho, sabia que o celular tocaria. De algum modo, sabia e foi desse modo que pegou o telefone na bolsa para checar e, um segundo depois, na sua mão, o aparelho vibrou. O aperto não passou, mas sim, ela tinha tempo para um café.

domingo, 5 de abril de 2009

Só está faltando a Dona Beija

Eles se separaram e quem saiu de casa foi ela. Ele ficou com o casal de filhos - a mais velha e o recém-não-mais-bebê.

As pessoas estão chocadas: Como uma mãe larga, assim, os filhos sozinhos?

Aí eu respondo: Não, ela não largou.Todas as quartas-feiras ela busca o casal na escola e em casa e, de quinze em quinze dias, os pequenos passam o fim de semana inteiro com ela: se divertem, tomam sorvete, brincam, vão ao teatro e ao cinema. E os dois não estão sozinhos... estão com o pai.

Os fulanos não entendem: Ah, mas ela é mãe... é crueldade deixar as crianças assim.

Eu tento explicar de novo: Não, ela não deixou... eles só se separaram.

Equivocados, continuam a argumentar: Mas é mãe. É instintivo.

Ainda com uma nesga de esperança na humanidade, esboço mais uma tentativa: Não, não é instintivo. É só uma convenção.

A humanidade insiste em me desapontar: Não... mãe é mãe. Tá dentro.

Só para ter certeza de que realmente estou ouvindo o que parece ser, lanço a pergunta final: O pai pode ir e deixar os pequenos com a mãe?

Os fulanos dão a resposta derradeira: Ah, o pai pode.

Aí eu penso que já deveria ter desistido dessa conversa na linha "As pessoas estão chocadas"*.

Levanto e olho pela janela, para ver se me depararei com carruagens, homens bigodudos, mulheres de vestidos armados, Dom Pedro desfilando e escravos levando chibatadas num tronco - chibatadas legitimadas pela mesma "biologia" que justifica esse instinto materno ma-ra-vi-lho-so e con-ve-ni-en-tís-si-mo.

*Preciso parar com essa mania de só reparar o lugar onde precisava ter cortado a conversa, muitas linhas depois.

quarta-feira, 18 de março de 2009

Desventura de viver à espera

Quando a exibição do primeiro episódio do programa acabou, as luzes não voltaram a acender; apenas a do palco, que exibia o banquinho agora ocupado por Adriana Calcanhoto. Aplausos.

Tranquilidade pura, até a segunda música, pois ela desandou a cantar eu sei que vou te amar, por toda a minha vida eu vou te amar, em cada despedida eu vou te amar. Desesperadamente, eu sei que vou te amar. E cada verso meu será prá te dizer que eu sei que vou te amar, por toda minha vida....

Como se já não bastasse, a bandida continuou com a letra e engatou no Eu sei que vou chorar a cada ausência tua eu vou chorar, mas cada volta tua há de apagar o que esta ausência tua me causou.

Puxa, Calcanhoto, brincadeira, né. Vamos parar por aí?

Mas ela não parou e, com requintes de crueldade, naquela voz baixinha e quase aconchegante, lançou a sentença final: Eu sei que vou sofrer a eterna desventura de viver à espera de viver ao lado teu, por toda a minha vida.

Como eu vi que não adiantava de nada tentar mandar na artista, inciei o teste da minha autoridade com o que tinha dentro de mim: lágrimas ávidas pelo show começavam a querer sair de qualquer jeito, mas eu disse não. E elas me ignoraram solenemente, descendo uma a uma, com os bracinhos levantados no tobogã da minha bochecha maquiada – eu podia ouvir o gritinho de iupiiii de cada uma.

Bandidas. Lágrimas e Calcanhoto, ardam no mármore do inferno, vocês todas.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Capa feia.

Li o livro na faculdade, quando ainda fazia letras e achei maravilhoso. Emprestei para alguém que não lembro quem e o livro não teve os famosos "dois vês", mas um fenmv*.

Agora, O Leitor bombou no cinema e eu não vi, quero ver, mas também não estou com pressa. Quero o livro de novo, para ler mais uma vez antes de ver o que fizeram com as imagens que eram só minhas.

Mas já viram a capa do livro?


Me recuso. Precisava da Kate Winslet ilustrando?



*foi e nunca mais voltou

Desencontros.

Tudo aquilo que ela precisava era da certeza do amor dele, e da sua garantia de que não havia pressa, pois tinham a vida pela frente. Amor e paciência - se pelo menos ele tivesse conhecido ambos ao mesmo tempo - certamente os teriam ajudado a vencer as dificuldades.

(...)

Na praia de Chesil, ele poderia ter gritado o nome de Florence, poderia ter ido atrás dela. Ele não sabia, ou não teria querido saber, que, enquanto fugia, certa na sua dor de que o estava perdendo, nunca o amara tanto, ou mais desesperadamente, e que o som da voz dele teria sido seu resgate, e que ela teria voltado atrás. Em vez disso, ele permaneceu num silêncio frio e honrado, na penumbra do verão, a observá-la em sua precipitação ao longo da orla, o som do seu avanço difícil perdendo-se entre o das pequenas ondas a quebrar na praia, até ela ser apenas um ponto borrado, desaparecendo na estrada estreita e infinita de seixos brilhando sob a luz pálida.

Do livro Na praia, Ian McEwan

terça-feira, 10 de março de 2009

peçonhas

Com menos de 8 dias de intervalo, uma perereca pulou no meu peito e uma lagartixa na minha mão.

Eca.

Mulheres são de Vênus e homens de qualquer canto (ou de lugar nenhum).

10.03
Hora do almoço.
Aquelas histórias escabrosas de namorados que esperam a mulher engravidar para se declararem confusos e aparecerem, uma semana depois, apaixonados por alguma teenager que representa tudo o que eles diziam lutar contra.
Aí mentem, machucam e ficam muito bem, obrigado, decepcionadíssimos com o descontrole feminino, chocados com a suposta imaturidade de suas ex.

(In) felizmente, tenho amigos do bloco da testosterona que confessam:
É. Somos assim: enrolamos quando sabemos que a resposta é não. Inventamos desculpas e acreditamos nelas para sairmos das histórias com a consciência limpa, nos sentindo justos e honestos. Porque a cabeça do homem é simples, Carol. É sim ou não e quando ele diz 'não sei' ou 'talvez', joga para o campo do não, porque se fosse sim, ele estaria dentro. Um dia, ele vai entender isso e, optar se continua na molecagem ou se parte para a verdade.

Liderando as lições do bloco da testosterona, vem meu pai, com a célebre frase de minha primeira grande decepção com esse mundo nefasto do universo heterossexual masculino:
Filha, homem entra no puteiro e precisa se apaixonar pela puta pra poder trepar com ela. Aí trepa, paga e vai embora.

Ok, desde que não conquiste a puta, né, pai?

*

O importante é que no meio desses furacões, a gente descobre coisas e pessoas. Pessoas que estavam ali de algum modo, mas que, por falta de oportunidade, ainda não nos tinham feito tão bem. Pessoas que talvez nunca terão a dimensão da importância da ajuda. E são essas as pessoas que mais merecem saber.

É um chopp que faz bem, um livro que lava a alma. um abraço que acolhe, um filme que vira análise, um cafuné.

Verborragia Alérgica.

Dúvida. Egoísmo dos problemas e das dores que aprendera a não tolerar. Contundência. Urgências de respostas, soluções. Pitadas grosseiras de saudades rasgantes, bailes e sujeiras, cheiros de um amor inacabado. Goles, mordidas, fôlegos, perguntas. Pedidos e convites, autocentrismo.

Inventei uma flor com teu nome e ela é laranja e grande. Suas pétalas me chamam para si e indicam o mapa que faria com que chegasse até o teu castelo. Inabitável castelo, com elefantes e torres gigantes, enigmas abridores de portas fadadas ao trancamento eterno. Chamas de uma fogueira de fagulhas baixas, de caminhos inacessíveis. Lágrimas, erros, estupidez. Murros em pontas de faca, águas moles em pedras duras que de nada adiantam para transpassá-las. Sonos e despedidas, faltas de ar, cansaço. Ditados de 4 ou 5 dias intermináveis.

quinta-feira, 5 de março de 2009

Cada um por si e Jimena por ninguém

Jimena e Jacó terminaram. Jimena ficou numa de ausente, querendo meio que o mundo explodisse inteiro, que pouco ligava se o Jacó fosse cansar dessa situação, mas, como a gente sabe, esse sentimento só vem porque a gente não sabe como vai ser quando o outro cansar de verdade.

Aí o Uruã ainda ligou algumas vezes, chamou pra sair, mas não rolou cinema nem japonês: ele só queria saber de motel e, lá pra terceira vez, ela deixou ele dormir na casa dela. Ficou mal, a bichinha, depois que ele comeu pão de 7 grãos com queijo minas, bebeu o suco de mamão com laranja e cenoura que ela fez especialmente pra ele e levou na cama, tomou banho, usou uma toalha limpinha, botou o tênis, a bermuda e a camiseta e foi embora. Ela ficou esperando um torpedo, uma ligação, essas coisas de gente que gosta e espera que o outro goste também. Uruã nem tchum.

Tá querendo voltar para o Jacó, que já está em outra, mas ela não sabe ainda. Eu sei porque encontrei com ele numa festa, amarradão, tranqüilo, curtindo a vida.

Aí ontem a Eliza contou pra ela que tinha saído com o Uruã: parece que ele a levou numa festa de uns amigos. Tipo 'date' mesmo, apresentou Essa aqui é a Eliza , para todos os amigos dele.

To tentando chamar a Jimena pra sair, ir ao cinema, caminhar na praia, mas ela tá super desanimada, meio sem vontade de fazer qualquer coisa.

des tração

Tinha que entregar o projeto final até as 16:00 de amanhã. Mas não conseguia se concentrar e ainda faltavam algumas muitas páginas. E porra, por que tudo isso? Aquele esforço seco, parto entupido, palavra que não vinha. Carmem não conseguia se concentrar. Copão de guaraná ao lado, palitinho preso no olho. Pensava na vontade de trabalhar de bermuda, de correr na praia às nove da manhã e ir ao cinema no horário dos velhinhos. Passava a língua no espaço entre os dentes e ficava prendendo a ponta da língua por lá. Amanhã ia ficar dolorida, mas já tinha viciado no movimento. O arcondicionado ia direto nas costas da cadeira do computador.

Elaborou, mentalmente, um e-mail para o orientador, pedindo mais um dia. Aí lembrou que ela já estava no mais um dia que já havia sido pedido. E não podia perder a credibilidade, precisava entregar isso, acabar logo com essa masturbação acadêmica e ir para "os finalmentes", cujo significado era completamente desconhecido.

[Água com gelo. O caminho do quarto à cozinha era como um inferno na Terra: calor até não poder mais, bafo quente no corpo, desconforto físico. Desconforto melhor do que aquele que o arcondicionado não ajuda, nem no máximo.]

Pensou que a amiga tinha razão: Chico Buarque acertou em cheio quando chamou Deus de cara gozador e lembrou do Rei de Havana, que cagava pra Deus, não acreditava em porra nenhuma, nem nele próprio.

Carmem estava de saco cheio e parou para se alongar. Lembrou de uns exercícios que a amiga zen tinha ensinado para os momentos de angústia e dor nas costas. Mas doía tudo, até na hora do exercício. Riu sozinha imaginando a cena esdrúxula de uma mulher com pijama florido se esticando e respirando alto, no meio do quarto às três da manhã.

Riu sozinha. Gostou de rir sozinha e riu mais um pouco, só de brincadeira, mas antes preferiu se assegurar de que todos na casa estavam dormindo; não queria correr o risco de alguém abrir a porta e flagrá-la nessa situação. Riu por alguns minutos, rindo do riso, rindo do esdrúxulo, dos pijamas floridos, do texto sem nexo que estava escrevendo. Riu da dor nas costas, pois ela aumentava quando o corpo contraía com as gargalhadas silenciosas e levantou os braços, mexendo meio louca.

Começou a dançar sem música na cabeça, só dançar, considerando que dançar seja se mexer em algum ritmo. Dançou devagar, para não acordar ninguém: nada de movimentos ou pisadas bruscas, deixando que seja lá qual fosse o ritmo inventado, tomasse conta daquele pequeno círculo vazio que seu quarto disponibilizava.

Carmem dançou por dez minutos, rindo. Rindo da dança, do exercício zen, de si mesma. Ficou por alguns minutos exclusivamente em sua companhia. Ficou em si, entrou nela sem perceber. Fez movimentos com a cabeça, girou os pés, exercitou o maxilar, se distraiu, de novo.

Voltou a sentar em frente ao micro com o vento gelado nas costas e se assustou com a hora, mais uma vez.