segunda-feira, 31 de maio de 2010

Viciada na com crê tudo.

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paulo.

Sonhos concretos

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morados.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Sessão Amigdalite.

Enquanto os meus gânglios não viram duas Jabulanis pra azucrinar os goleiros da copa do mundo, eu vou seguindo com a tentativa dessa semana histórica do tédio passar o mais rápido possível.

Já conferi, de cabo a rabo, as programações das tvs aberta e fechada no período da tarde e da madrugada (porque a hora de dormir talvez seja a mais irritante por conta da dor rasgante que começa no fim da língua e termina na alma, se é que termina), já brinquei com os bibelôs do mundo nerd no quarto do meu irmão, discuti 74 vezes com a minha mãe, apertei 47 vezes em um minuto o botão de refresh da minha caixa de entrada de emails, entre outras vãs alternativas de ficar tranquila nos intervalos do antibiótico de 875 mg ou o maior comprimido do mundo.

Parece uma piada sem graça: você tem uma dor de garganta que te tira do sério e para que a amigdalite purulenta [sic Sidinho] vá embora, você precisa ingerir uma caneta de dez cores de 12 em 12 horas. O comprimido só perde pro Geneal duplo.

Ontem, no entanto, como a insônia já era prevista, liguei para a locadora e o mocinho deles trouxe-me 3 filmes - que foram vistos em sequência, tal qual uma temporada de Lost (snif...).

Enfim, vi "Amor sem escalas" (Up in the air), com o pediatra do ER cada vez mais belo e charmoso, numa trama que muito me agradou.


Eu sei que não sou imparcial para certos assuntos e raramente um roteiro que trate do digamos Lado B universo afetivo me soa bem. O primeiro foi "O grande garoto", roteiro adaptado do romance de Nick Norby. Gostei muito do olhar para o mundo das descartabilidades (existe isso?) de pessoas, tanto no mundo corporativo como nas relações que estabelecemos fora daquelas às quais somos obrigadas e como podemos aprender com elas. Gosto quando alguns pontos de vistas que (até então) não se encaixam nos convencionais são apresentados sem maiores julgamentos.

Boa parte do filme segue por aí, e mesmo com as já esperadas e conhecidas lições e o (nem sempre verossímil) arroubo do amor que aprendemos ser correto, o saldo foi positivo. Nota 8,5

Em seguida, para Dona Rose não desistir do terceiro, botei Gloria Pires e Paulo Miklos no DVD e me surpreendi com "É proibido fumar".


Gloria Pires arrasou na solteirona professora de violão tentando dar um jeito na vida enquanto disfarça suas fraquezas e tenta controlar a compulsão dos cigarros. O quanto precisamos/podemos engolir de sapos para levar uma história adiante? O que a gente releva do outro quando gosta... a gente gosta ou a gente precisa realmente de alguém? Como essas coisas são percebidas, se é que são - já que nem sempre temos uma fita nos mostrando o que o outro viu de meleca que colocamos debaixo da mesa?

A história me desceu redondo, a tensão veio na medida certa, o desfecho foi equilibradamente surpreendente e previsível. A rotina de trabalho, as picuinhas de família e a dificuldade das pessoas em aceitar as opções alheias foram tão bem colocadas - sem muita breguice, sem muito engajamento -, que cada personagem ou situação ganharam minha torcida. As cenas no cubículo depilatório arrancaram gargalhadas.

O filme arrancou não só gargalhadas, mas lágrimas, surpresas, identificações. Saldo positivíssimo.

E por último, mas não menor, revi Abraços Partidos (los abrazos rotos).


Pausa para três suspiros.
Ahhhh
Ahhhh
Ahhhh

Vou revê-lo mais uma vez, daqui a pouco, sem som. Aquela harmonia de vermelhos, azuis, roxos, amarelos, mosaicos, cenários de Hoper, Penelope Cruz divina ali no meio do arco íris vibrante... cada detalhezinho das paredes, da pipa na areia da praia, na camiseta do Diego discotecando, no vidro da recepção do hospital.


Tudo é lindo no mundo de uma história dentro da outra, dos segredos loucos desabafados como presentes estranhos de aniversários. Relações doídas, doidas, enterradas, cegas. Um carinho para a visão e um agradecimento ao bom gosto, ao olho, às mãos e às referências de quem torna isso possível.

Acabou o terceiro e o único arrependimento foi de não ter alugado o quarto. A ideia era alugar Sherlock, mas achei exagero. Talvez fosse, pois se depois de três saldos tão positivos (minha conta bancária invejou) eu vejo alguma coisa more or less, ia estragar esse bloco satisfatório.

Depois continuei de frente pra tevê, me entupindo de enlatados que o mundo a cabo oferece. Aproveitando o mundo a cabo que a casa de mãe oferece.

Para hoje, aceito sugestões.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Sick Lady

Foram dois dias que ela esteve presa. Por 48 horas, só percebia que a manhã dava lugar à tarde que saía de cena para a noite porque olhava para os relógios da casa. Não havia castigo pior do que o de não poder ver a rua, dar bom dia ao porteiro, tomar suco na esquina, correr perto da ciclovia. A moça adorava a rua e tudo que vinha de fora pra dentro, mas agora não poderia sair por mais algumas horas. Estava muda, com pés presos e mãos atadas no chão, na doença. Um pouco ousado do sol entrava pela fresta da janela e dava o gosto do mundo a alguém que não poderia, tão cedo, passear e voltar com as bochechas rosadas.

Suspirava de desânimo, gemia de dor, reclamava da sorte enquanto mudava de canal, compulsivamente e procurava notícias bizarras na internet.Lamentava a solidão, a ausência de remédios mágicos para sua cura, temia a provável necessidade de um tratamento mais agressivo, rezava por um imprevisto em forma de milagre, uma saúde nova, uns oito anos a menos.

A porta do quarto se abriu para o remédio das quatro entrar. Comprimido empurrado por copo de leite que arranhava a garganta ao descer, deixando gosto de plástico na boca pelos próximos poucos minutos. Remédio ruim, lento, beirando o desnecessário. Enfadonho. Era a quarta dose e a dor só fazia aumentar - algo dizia que a prescrição médica não havia sido a melhor. Praguejava por não ter optado pela automedicação que exemplificava sua obediência cega aos bons costumes e regras difundidas na tevê.

A hora do sono chegou, mas o sono não. Sabia que precisava dormir, pelo próprio bem estar, pela recuperação, por sua saúde. Mas já havia aprendido que carneirinhos contados não faziam gente crescida dormir. Reclamou em silêncio mais uma vez das faltas que preenchiam sua vida e dos acontecimentos que só faziam esvaziá-la.

Antes que pudesse perceber, dormiu como todos quando dormem não percebem e sonhou, como todos sonham e nem sempre acordam lembrando.

The flu

Ficar doente é um saco. (Mó ruim, né, Bia!)

Segunda à noite um vírus mala se atracou comigo e a garganta fechou, o corpo foi de 36 pra 38,6 e os ossos resolveram doer enquanto a cabeça explodia e o olho mareava. De lá pra cá, que saco! Hospedei-me na casa da mãe, com direito a pai dando pitaco e os dois dizendo o que eu posso ou não fazer. Ir pra minha casa é algo que eu não posso fazer. (!!!)

Essa coisa de corpo é louca.
De repente você não está mais bem e obedece todo o ciclo de um trequinho que entra em você e começa a agir pra te derrubar. Daí cresce uma bolota entre o pescoço e a mandíbula que faz doer quando engole. E eu não posso andar descalça, meu pai manda trocar o edredon por um lençol, não posso ligar o ventilador (e eu amo vento), o banho tem de ser frio.

Irritação.
Pior que tpm; puta ao extremo. Não consigo responder nada de forma delicada.

Uó.

terça-feira, 25 de maio de 2010

It´s over

Curto, mas intenso. O tempo foi pouco, mas quando eu a conheci, não pude descansar em paz. Precisava desvendá-la, entendê-la, brincar com ela, questioná-la, sugá-la até não poder mais. Foram talvez dois meses apenas de convívio: alguns dias inteiros, quando ficávamos sem sair de casa e eu ouvia seus barulhos, sussurros e ria de suas piadas.

Acabou, como tudo na vida faz um dia: começa, faz uma graça e acaba. Talvez, por não gostar muito de conclusões finais, fiquei um tanto quanto melancólica quando vi ontem o episódio final de Lost.

Não foi bem como eu pensava, mas foi como devia ser, como tudo que acaba, quando tem vida própria.

Lost in piece.

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O sol está sempre ali no céu
A terra é que faz o carrossel
De noite o sol apaga sua chama
E dorme debaixo da minha cama

[Arnaldo Antunes e Edgar Scandurra, em "O Sol"]

Enquanto o sol se reveza para descansar debaixo da cama de Antunes e Scandurra, a lua bate ponto na janela que me cabe nesse latifúndio.E ela tá foda, como sempre eu achei a lua e oferecia aos meus amores e amigos. Pedi ao penúltimo uma foto da moça. Cheia redonda, amarela, vermelha, laranja, brancona, impressa num papel fosco, moldura branca pra destacar... mas ele não deu. Falou que não dava pra tirar foto da lua; a luz era complicada, segundo ele.

Mas ela bateu ponto. Sempre que eu olho, ela está lá. Quase sempre, claro. Tem dias que eu não vejo, tem dias que ela não está desse jeito. Mas olhar pro céu foi um hábito construído.

Cheguei e olhei o céu preto e frio e não sei se é a febre que me pescou no teatro cheio de gente, mas acho que ela está desfocada agora. Um troço meio lá e cá de lua, que você não define cor, forma, tamanho, luz.

E é engraçado como qualquer coisa passa a ter um significado pra você, quando o olho aponta com força pra coisa olhada. Ou perde o sentido: tenta repetir uma palavra consecutivamente: você não sabe se a primeira sílaba é a última ou a segunda. Ela deixa querer dizer alguma coisa e passa a ser ritmo. Aí você acha bobo e se pergunta como chegou a essa idade rindo dessa grande bobagem? Mas não é bobagem, é coisa que se for boba, tem ritmo e já morou no dicionário em algum momento.

O truque da palavra, no entanto - já não me iludo mais - não funciona com qualquer pensamento repetido e pode ser fatal se você repete um nome sem parar para torná-lo ininteligível. Nesses casos, o batizado com o nome pode entender como um vocativo gago, falado mil vezes e atende. E volta com força socando a sua cabeça como que com um martelo. Bate nas orelhas, belisca a ponta do seu peito, sussurra no pescoço pra te arrepiar - tudo isso quando você quer é esquecer. O único erro foi usar o truque da palavra.

Não use mais truques errados para esquecer um amor. Ele pode bater ponto na sua janela, entrar no sonho e fazer você acreditar que se pertencem, mas era você chamando e aí então não se pode reclamar.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Ou isto, ou aquilo, ou porra nenhuma.

Podia ser pior.

Verdade, mas podia ser bem melhor também. É sempre melhor do que poderia, mas nunca bom o bastante: frustrar ou resignar? Esperar ou correr feito louco? Está muito caro ou eu que ganho pouco?

As reticências nunca parecem se atrasar, ainda que cheguem sem muita conclusão. Tem coisa pacas a ser feita, tem escolha, tentativa, tem erro a vera pela frente. E as funções de casa não acabam, a poeira não para de entrar pela janela, beliscando a minha intolerância perante o mundo.

Tenho tentado dançar mais. Ver mais e conversar com pessoas. Entender, mesmo limitando-me ao que o entendimento permita.



Desabafos.

Quinta feira, vésperas de páscoa. Saudade. Preciso de um cigarro, de um baseado, tomar uma cerveja. Cansada. Trepar. Gritar no orgasmo, suar e acabar dormindo. Mas sem vontade de acordar com ninguém ao meu lado. Olhar e ver algum nu diferente, roncando. Aquele pau pendendo pro lado, o cheiro do pacote aberto da camisinha. Preguiça de um nu. Sem tesão, quando sem Antonio. Quase já não me amo mais. Vejo meu corpo descuidado, cabelo sem corte, sobrancelha crescendo. Estou esquecendo de mim mesma, ficando doente, jogada, encolhida. Precisando de colo, de ginástica, de um médico. [ desabafo ]. A dois passos do desemprego, ainda no mirante da cobertura. Necessidade do alcance. Preciso dar um jeito na dor de cabeça, na menstruação desregulada, na barriga crescendo. Ser feliz asteriscamente falando: em todas as direções e sentidos. No corpo todo.

[Ando tentando entender acordada, viver em conjunto.]

Rumo a.

Um nome para o dia de hoje? Liberdade. Dois nomes? Liberdade e esperança. Uma frase? Estou melhor. Um resultado? A dor de cabeça sumiu.

Pedi demissão e fiz um texto de despedida tão bonito que quase me emocionou. Desencaixotei sonhos, esperanças, expus meus nãos.

Saí pelo corredor trancando a porta e o elevador chegou assim que eu chamei e ele estava subindo. Entrei no elevador. A cobertura tem vista e não é para o horizonte. Não quero mergulhar nele. Quero a orla, a piscina, o lago, o rio. Eu desejo o real. É pouco e complexo, mas eu amo. Preciso amar as coisas e meus projetos, assim como amo Antonio. Assim como eu investi em nossas noites, nossos encontros. Preciso amar minha energia, usá-la a meu favor. Não ao horizonte.

Preciso tentar a primeira vez. Ana Maria citou Chico Xavier hoje ao telefone: algo como fazer algo que nunca se fez para conseguir algo que nunca se teve. Quarta feira, pré feriado de páscoa.

Perdi a contagem dos dias sem Antonio. Acho que estou fechando a segunda semana. Não conto com o colo de sábado, concessões não são encontros. Antonio não estava ali, não me beijou na despedida e não quer me ver de novo. E eu continuo sem querer conversar a respeito. Amo Antonio e isso não é mais novidade.

Estou envelhecendo e me parece normal que as novidades sejam cada vez mais escassas.

habemos flores.

tem flor na sala. vermelha, seca, não menos bonita por estar morta. nem sempre a vida é tão bonita e a flor seca é de um vermelho tão vivo que talvez, na vida não tornasse tão vivo e quente aquele ambiente. a primeira flor. já respirou e sugou da terra o que devia e carrega, de alguma forma todo esse alimento. a tinta que passou por cima dos passos dos insetos não causou tanto estrago. a abelha que carregou sua semente provavelmente também não esteja voando, tão pouco enfeitando, em um jarro, alguma mesa ou canto de sala.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Metamorfose sem verbo.

Acho que tô virando um caracol.
A vontade é me enroscar em mim mesma.
Até virar um ponto final.

Então, dois dedos afastada da margem, um novo parágrafo.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Outro mundo

terça-feira.

Gone. Já era. Menos um dia. Péssimo dia, aliás.

Tenho um outro trabalho. Não menciono na apresentação porque acho que me trai, me estraga, desaponta quando descobrem que eu trabalho em “escritório”.

O mundo que paga minhas contas é horrível e meu horário comercial é ocupado por bossalidades compartilhadas por seres vivos desprezíveis de idéias irrelevantes. Um mundo que, inclusive, me fez pensar de modo tão arrogante, permitindo registros desagradáveis como o anterior. Não tenho culpa, esse ambiente creme e bege nude me proporciona episódios tão desconfortáveis quanto um sapato numero 34 num pé tamanho 36.

Trabalho com mais 87 pessoas e divido a "baia" com uma ninfeta loira de brincos dourados, cuja melhor amiga nutre uma calvície hipnotizante. As duas acabaram de parir e “trabalham” mais de 10 horas diárias, ou pelo menos deixam as crianças para desfilar com seus laptops enquanto difundem jargões neologidados especialmente para o mundo dos recursos humanos. Mundos do universo maior de RH.

Hoje eu quis um abraço do Antonio. Acho que faria bem dormir com ele por mais essa noite. Segurei o telefone, mas não voltei a chamá-lo. Contive toda minha insatisfação e a descarreguei num telefonema. Tinha perdido metade da minha aula, meus alunos ficavam a ver navios por conta das vaidades de uma loira que deveria estar amamentando quando na verdade, vibra com um PowerPoint animado. Estou cansada e a comida estava sem gosto (ou minha língua não estava com disposição de sentir muito mais sensações.).

Amanhã vou ao aeroporto para mais uma reunião em Porto Alegre. Essa era a minha sexta reunião por lá e eu nunca consegui conhecer a cidade além do aeroporto – filial da empresa. Estranho? Nem tanto. Trata-se de uma realidade normal no nude world. O ppt, o checklist e o localizador já estavam impressos.

Pena que o localizador não assumia a função sugerida em seu nome, pelo menos não nessa terça feira.

Janela da Alma

Algo estranho com os meus olhos. Entre eles e o mundo, uma quebra. O lado de fora embaça; o de dentro, naufraga. Duas placas sem ponte, dois globos independentemente vivos. O de fora construído por dentro é meu e tão meu que pensa ser também o de fora, meu. Mas cada vez que olho de fora, mais um mundo aparece e assim é a progressão geométrica do que está errado com os meus olhos. Tem sempre mais um mundo pra ver e entender. A placa de dentro cansa de olhar pela janela, já é escuro.

domingo, 2 de maio de 2010

Sem Antonio

Eu estava ficando velha. Já não sofria mais por amor.

Quando Antonio disse, n'aquela tarde, que não voltaria mais, não parecia que meus braços estavam caindo e que um rato comia meu estômago. Eu chorei uma tristeza calma, desolada, uma dor consciente de sua efemeridade. Eu ainda precisava tirar as roupas do varal e tomar rápido o café, pois, apesar de ser sábado, eu tinha, à tarde, duas aulas para dar.

E já tinham se passado 24 horas desde o nosso último contato. Enquanto eu manobrava o carro na garagem, lembrava da nossa última noite.Deu saudade e eu chorei de novo, mais um pouco.

Era primeiro dia de aula; eu estaria ocupada demais e o espaço de Antonio já não era tão grande. Eu podia viver sem ele e gostei de estar ficando velha. Talvez eu fosse alguém a quem ninguém fosse abraçar permanentemente para a vida. E aí sim, virar uma velha sem noção, aos 70, meio surda, meio bêbada, viciada em buraco e sueca, amiga de flanelinhas, quem sabe até com um filho meio desnorteado que preferiu morar com o pai, ainda que eu tivesse reservado na minha casa um quarto para ele dormir quando me visitava, semanalmente.

O Antonio não me daria filhos. Acho que o Antonio nunca deu nada pra mim. Digo, em longo prazo. Ele dava sensações pontuais, prazer por si só. Para o longo prazo, restavam apenas as lembranças, que ainda estavam pontiagudas, espetando no estômago. A velha aqui, no entanto, já entendeu que essa não é a pior dor. Já fui a enterros mais tristes. certamente.

Sábado é um bom dia para se dirigir; o trânsito é livre e as pessoas agem como se estivessem sem compromisso de horário. Melhor: eu ajo como se assim fosse, ainda que o que correspondesse a minha realidade era o fato de ter 20 minutos para chegar até a universidade.

Meu nome é Branca, estou beirando a idade que faz vislumbrar as próximas, pela primeira vez. Percebo o quanto o meu sentir vem mudando.

O fim de semana pegou carona com uma vespa e quando dei por mim, já estava cumprindo a deliciosa obrigação social do chopp de domingo com 2 ou 3 amigos que me ajudam com a (boa) displicência a passar por mais esse término afetivo. "Mais esse" - e eu digo em relação a minha vida e em relação às passagens de Antonio por ela.

Nem sempre é significativo, mas é importante dizer que sou a última solteira do meu grupo de amigos. Muitas vezes, esse fato (ou a ausência de um fato mais importante) me caracteriza no grupo: ando sozinha há anos, ainda que os amigos insistissem, há anos atrás, que alguém legal apareceria e que quando menos esperasse, estaríamos juntando os trapinhos. (Ainda bem que todas elas seguiram caminhos profissionais não místicos; uma tenda de vidente não as levaria ao sucesso.)

Solteira já tinha passado do meu estado civil para algo que me qualificava como aquela que eu sou. E eu tinha aprendido a ser essa mulher que muitas vezes fazia seu público jurar que tinha optado, por prazer, pela solidão, Público sim. Eu atuo, na maioria das vezes. tranco-me numa esquisofrenia de um mundo complexo e íntimo e finjo - para poder conviver - que tal mundo não existe.

A segunda feira já tinha chegado e estava prestes a se despedir de mim: 21:00 - essa era a chocante informação que meu celular fornecia.

Fiquei feliz: tinha sobrevivido ao terceiro dia sem Antonio.