terça-feira, 25 de maio de 2010

títulotítulotítulotítulotítulo

O sol está sempre ali no céu
A terra é que faz o carrossel
De noite o sol apaga sua chama
E dorme debaixo da minha cama

[Arnaldo Antunes e Edgar Scandurra, em "O Sol"]

Enquanto o sol se reveza para descansar debaixo da cama de Antunes e Scandurra, a lua bate ponto na janela que me cabe nesse latifúndio.E ela tá foda, como sempre eu achei a lua e oferecia aos meus amores e amigos. Pedi ao penúltimo uma foto da moça. Cheia redonda, amarela, vermelha, laranja, brancona, impressa num papel fosco, moldura branca pra destacar... mas ele não deu. Falou que não dava pra tirar foto da lua; a luz era complicada, segundo ele.

Mas ela bateu ponto. Sempre que eu olho, ela está lá. Quase sempre, claro. Tem dias que eu não vejo, tem dias que ela não está desse jeito. Mas olhar pro céu foi um hábito construído.

Cheguei e olhei o céu preto e frio e não sei se é a febre que me pescou no teatro cheio de gente, mas acho que ela está desfocada agora. Um troço meio lá e cá de lua, que você não define cor, forma, tamanho, luz.

E é engraçado como qualquer coisa passa a ter um significado pra você, quando o olho aponta com força pra coisa olhada. Ou perde o sentido: tenta repetir uma palavra consecutivamente: você não sabe se a primeira sílaba é a última ou a segunda. Ela deixa querer dizer alguma coisa e passa a ser ritmo. Aí você acha bobo e se pergunta como chegou a essa idade rindo dessa grande bobagem? Mas não é bobagem, é coisa que se for boba, tem ritmo e já morou no dicionário em algum momento.

O truque da palavra, no entanto - já não me iludo mais - não funciona com qualquer pensamento repetido e pode ser fatal se você repete um nome sem parar para torná-lo ininteligível. Nesses casos, o batizado com o nome pode entender como um vocativo gago, falado mil vezes e atende. E volta com força socando a sua cabeça como que com um martelo. Bate nas orelhas, belisca a ponta do seu peito, sussurra no pescoço pra te arrepiar - tudo isso quando você quer é esquecer. O único erro foi usar o truque da palavra.

Não use mais truques errados para esquecer um amor. Ele pode bater ponto na sua janela, entrar no sonho e fazer você acreditar que se pertencem, mas era você chamando e aí então não se pode reclamar.