segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Até quando esperar?

[Do feriado.]

Estava eu, há poucos minutos, num momento mulherzinha com uma grande amiga: bebendo vinho com um filme há horas no pause, como se fôssemos engatar algum momento, mas não. Queríamos rir, falar, nos lamentar, reclamar, pedir opiniões, desabafar, checar e-mail, distrair.

Mania de amiga.

Perguntávamos uma à outra e, no fundo, uma perguntava a si própria: por que desencontro? Já não chega, já não levamos tudo o que podíamos? Quando arriscar, quando não ir, quando parar, quando se cansar? Ela tentou me (se) tranquilizar e falou:

– ..., se bem que uma amiga me disse que existem várias mulheres dentro da gente e, a cada história, matamos uma delas. Sempre na próxima história a gente mata mais uma.

Eu, ainda decidindo se estava diante de uma boa notícia ou não, perguntei:

– Será?

Um pequeno silêncio se formou (quem me conhece sabe que só é possível, comigo por perto, um bem pequeno silêncio; essa coisa de nãofalar nunca esteve entre minhas maiores aptidões) antes que eu concluísse:

– Tá bem. Eu topo. Mas pergunta pra essa amiga aí quantas a gente precisa aniquilar. Eu tenho de saber se pra mim faltam 15, 35, 80 ou 417!

Depois de algumas gargalhadas, ainda meio inconformadas e com os dentes levemente arroxeados de vinho, começamos a calcular quanto tempo ainda precisaríamos, tendo em vista que cada mulher dessa carece de uns seis meses de história, no mínimo, antes do último suspiro.

Estava vendo a hora em que marcaríamos um carnaval na Bahia para agilizar o processo: tentar matar umas seis safadas em uma semana. Uma espécie de paredão interior, um corredor polonês sentimental. Foi um tal de fazer contas, estimativas, pensar em desenvolver planilhas, investigar cotas.

Chegamos a uma conclusão que poderia ser resumida da seguinte forma: “Amiga, tâmu matando mulher dos outros, não é possível! Tem gente que não matou essa mulherada toda ainda e tá aí tirando onda”. E desandamos a lembrar histórias alheias inexplicavelmente românticas.

Pensei na última palhaça morta. Tal pensamento acabou por me lembrar que a sirigaita interna anterior à última, a mulher da vez na fila da entrada do meu coraçãozinho, foi maldita. A danada galhofou a minha vida, me fez descer abaixo do nível do mar, dilacerou partes essenciais de autoestima, avacalhou todas as possíveis emoções do tempo que ela durou.

Não, amiguinha. Só nessa história aí morreu o equivalente a uma tribo indígena. Não era uma só mesmo. Matei umas dez mulheres da Deborah Secco, outras 17 da Britney, sem contar a bela contribuição que dei para quitar as fêmeas interiores de quatro ou cinco colegas do trabalho.

Eu e minha amiga, na verdade, não chegamos a uma conclusão. Ela ficou de perguntar para a dona da teoria se havia alguma informação na internet, alguma dica sobre o grupo seguidor da crença das muitas-mulheres-que-habitam-nosso-corpo-e-vão-morrendo-a-cada-história-nossa-de-vida.

O filme também não vimos. O vinho acabou, a fumaça saiu pela janela, continuamos sem resposta para nossas questões mais profundas. O combinado foi que eu voltaria com um texto, e ela, com a resposta do grande enigma.

Não sei se quero saber. Sério. Medo de descobrir que, depois de essa de agora morrer, ainda me restarão 55. Porque é a minha cara a ordem de grandeza ser daí para cima. Apenas mais cinco ou logo-a-próxima seria moleza demais. E nesse campo, pelo menos, minha vida nunca desfrutou de muita moleza.

Abraçamo-nos, ela voltou para casa, não sem antes deixarmos combinada a praia do dia seguinte: topei a ida ao Leblon, dentro do fusca, com um jornal e um livro, dar um mergulho ou não. Acreditávamos que ia fazer friozinho.

Em meia hora já estava cada uma em seu pequeno quadrado, com a cabeça martelando as mesmas dúvidas de antes. Um pouco mais felizes, por conta das horas anteriores – que, afinal de contas, foram ótimas!

[A trilha sonora do papo + o título do texto foram descobertos graças à amiga Lelê, que me hipnotiza, de tempos em tempos insere músicas em minha mente, de modo que não saiam tão cedo.]

[O arquivo veio do amigo fontecerta, que envia músicas boas e oportunas, sempre.]

[Revisão de texto: Luciano Rosa. Muitagradicida.]


Até quando esperar_Plebe Rude

3 comentários:

Devaneios disse...

E não é que é verdade?
Eu mesma já matei algumas. Mas, confesso, às vezes lembro delas com nostalgia.
Um segredo: da mesma forma que umas morrem, nascem outras! E continuamos, até o fim da vida, com esse monte de vozes dentro da nossa cabeça e com contraditórios sentimentos se espremendo no peito!
Bjs,

bia disse...

Eu matei muitas, mas há muito tempo que não mato nenhuma, hehe.
Muito bom esse texto, amei!
Beijos

Adriana disse...

Kérol, sempre muito bom vir aqui , gostei da parte de ir pra Bahia matar umas 6 safadas hahaha, se aqui nas micaretas de SP eu mato 2 toda vez que vou, acredito que indo prum carnaval na Bahia eu mato umas 50 safadonas hahahaha beijos