segunda-feira, 12 de outubro de 2009

ado. a-ado. cada um no seu quadrado.

Ele chegou e a casa estava vazia. A mulher não estava nua, pronta para recebê-lo. A cama estava feita, sem nenhuma ruga na colcha: sinal de que não haviam respirado por ali esses três dias que esteve fora. Apoiou definitivamente a mala no chão e ainda pensou duas vezes se tiraria de dentro dela as roupas que iriam para a máquina de lavar ou se deixaria para depois, tomando logo o banho que o calor da cidade tornava urgente.

Com um pé arrastando o calcanhar do outro lado, tirou cada tênis e os dedos suados encolheram-se, experimentando a liberdade depois das 3 horas e meia de viagem. Estava tudo do jeito que deixara. Até o livro na diagonal, posição escolhida intencionalmente, para ter certeza, na chegada, se a casa tivera ou não recebido alguma visita.

Ela não foi; a recusa se fez concreta. A mulher disse não e agora ele estava sem abraço. Sabia que o desejo dela era o de ter ido junto, participado da viagem, mas isso ele não poderia oferecer: esse convívio não cabia no gostar que ele tinha reservado para ela. E cada um gostava sozinho, um do outro, ainda que ao mesmo tempo, juntos. Ele percebia o quanto aquela mulher olhava dentro de seus olhos e pedia com o corpo para que ele a amasse. Ele entendia, mas não podia. Se pudesse, não seria mais ele, pois já seria alguém que sentia amor por ela. E ela, por sua vez, deixaria de ser aquela que tinha, na ausência desse amor, o maior brilho de esperança no olhar. Eles precisavam continuar assim para manter a essência que fazia dessa história o que ela realmente era, com seus limites, auges, intervalos.

Ela precisava fugir de casa pois precisava de colo e temia não bastar o cheiro e as cores das paredes. Temia querer ficar e não sair, temia precisar de mais e sabia que essa necessidade não tardaria em aparecer. Suou as têmporas para negar a oferta e agradecer. Dormir no quarto vazio e ouvir os barulhos de fora sem que o ombro sardento a acolhesse parecia sem sentido e tentador.

Deitada na grama, com os olhos apontando para o céu, tentou contar nos dedos os momentos em que quisera dizer algo para alguém e optou por calar-se. Descobriu que eles somavam mais de vinte, seria mais conveniente contar nas gramas, que eram incontáveis. Suspirou alto. Voltou para casa pedalando sob o sol e encontrou o quarto vazio, também. Desejou que ele estivesse pensando nela e pensou mais forte ainda, como que empurrando os átomos do pensamento para o espaço em que ele estivesse ocupando naquele momento, materializando o sorriso que gostaria de, então, oferecê-lo.

Tomaram banho e dormiram ao mesmo tempo, sem um saber do outro. Estavam muito cansados.